São Paulo, Quinta-feira, 25 de Novembro de 1999


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TEATRO
Peça inicia apresentações em presídio de SP
"Apocalipse 1,11" abre como ensaio

NELSON DE SÁ
da Reportagem Local

Não, não estréia hoje o "Apocalipse 1,11" de Antônio Araújo. O que "estréia" às 21h no presídio do Hipódromo, em São Paulo, é um ensaio aberto.
O diretor de "O Livro de Jó" telefonou anteontem, às pressas, para informar que: 1. Não foram liberados, pelo juiz corregedor, os presos do Carandiru para participar do espetáculo, como atores. 2. Também não foi liberada, pelo juizado de menores, a participação de uma menina. 3. O espetáculo finalmente recebeu mais apoio financeiro, mas o dinheiro só vai sair em janeiro, porque o investimento só podia entrar no orçamento do ano que vem da empresa.
4. A rubéola que derrubou o diretor por duas semanas foi vencida faltando só duas semanas para a estréia, programada em princípio para hoje, e ele não deu conta de tudo o que faltava fazer.
Se o relato voltar mais ainda no tempo, é possível somar, às "pragas" que cercaram o projeto do "Apocalipse": 5. A bolsa que levou o autor Fernando Bonassi a uma longa estada em Berlim, na Alemanha. 6. A saída do ator Matheus Nachtergaele, que estava nas primeiras fases de "Apocalipse" e vinha sendo protagonista do Teatro da Vertigem, a companhia de Antônio Araújo, desde o princípio.
Nachtergaele deixou o teatro de grupo, o que o diretor registra não sem mágoa, para seguir carreira em TV e cinema, negando-se a representar Jó no centenário do Teatro de Arte de Moscou, na Rússia. Mas o ator também dá as suas razões, como a permanência de quase um ano e meio do diretor em Nova York.
Por fim, entre as "pragas", é claro, entra: 7. A longa e afinal frustrada diplomacia para apresentar o espetáculo no Complexo Presidiário do Carandiru.

Cinco anos depois
Questionado se a rubéola havia sido a maior das "sete pragas do Egito" que atingiram "Apocalipse 1,11", o diretor mineiro soltou uma gargalhada e disse: "Não fala isso, não fala isso".
Ele próprio tratou de justificar que, se está demorando tanto para lançar um novo espetáculo depois do impacto de "O Livro de Jó", que completa cinco anos da estréia em fevereiro próximo, é porque é lento mesmo.
"Eu sou muito lento, as coisas são feitas devagar", diz Araújo. "E eu saí do "Jó" com um bode de fazer teatro. Muito cansado, muito desestimulado. Eu acho fazer teatro muito difícil, o esquema de produção, os ensaios sempre em condições difíceis."
O certo é que este "Apocalipse 1,11", que os paulistanos poderão ver por três semanas a partir de hoje, é ainda o ensaio aberto, quando muito a pré-estréia, o "preview" do teatro norte-americano, mas não a peça.
Essa ficou, ao que tudo indica, para estrear no dia 14 de janeiro do ano 2000, duas semanas depois do eventual fim do mundo.
Fim do mundo que está longe de ser o que importa, em "Apocalipse 1,11". "Não é o fim do mundo", diz o diretor, "mas fim de mundo. A gente brinca muito com a coisa de ser não o Apocalipse de São João, mas o Apocalipse da São João".
Araújo e o grupo insistiram tanto com Bonassi, para autor ou co-autor da peça, escrita toda ela a partir de improvisações dos atores, por desejarem o fim de mundo da avenida São João, não o da Bíblia.
O que os artistas de "Jó" buscaram foi um texto com a crueza do escritor, que impressionou o diretor já na versão teatral de "Um Céu de Estrelas", encenada por Lígia Cortez em 96. Araújo diz, sublinhando que o autor odeia a expressão, que Bonassi é o "fio terra" da companhia.
Em tempo, o "1,11" do título se refere ao capítulo 1, versículo 11, do Apocalipse de São João, o texto que fecha o Novo Testamento e inspira a história da peça.
Ele diz: "(Ouvi, por detrás de mim, uma grande voz, como de trombeta,) que dizia: O que vês, escreve-o num livro e envia-o às sete igrejas que há na Ásia; a Éfeso, e a Smirna, e a Pérgamo, e a Tiatira, e a Sardes, e a Filadélfia, e a Laodiceia".
No caso, Antônio Araújo, Fernando Bonassi e o Teatro da Vertigem mostram no palco o que vêem no apocalipse realista, nada alegórico, deste fim do milênio.


Peça: Apocalipse 1,11
Criação: Teatro da Vertigem
Dramaturgia: Fernando Bonassi
Direção: Antônio Araújo
Elenco: Vanderlei Bernardino (João), Mariana Lima (Babilônia), Joelson Medeiros (Anjo Poderoso), Míriam Rinaldi (Noiva) e outros
Quando: qui. a sáb., às 21h; dom., às 20h.
Onde: presídio do Hipódromo (r. do Hipódromo, 600, ao lado da estão Bresser do Metrô, tel. 0/xx/11/572-6062)
Quanto: R$ 5
Apoiadores: Instituto Cultural Itaú, Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, Oficina Cultural Oswald de Andrade, Ministério da Cultura (Funarte, prêmio Flávio Rangel)


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