São Paulo, Quinta-feira, 25 de Novembro de 1999


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CINEMA
Orquestra, atrasada, não alcança música de Guarnieri
Festival de Brasília 99 tem fiasco na noite de abertura

INÁCIO ARAUJO
enviado especial a Brasília

Se a noite de abertura define o que um festival será, Brasília 99 tem tudo para ser um belo "flop".
Por volta de 21h de terça-feira, com mais ou menos uma hora de atraso, a orquestra do Teatro Nacional de Brasília iniciou a apresentação de um dos movimentos do Concerto nº 4 de Camargo Guarnieri.
Detalhe: a orquestra estava no fosso, como se acompanhasse uma ópera, de maneira que os convidados só viam a cabeça dos músicos e uma mão que se agitava entre elas, a do maestro. No palco, cinegrafistas de TV tomavam o lugar de honra e gravavam cenas da orquestra invisível.
Em plena apresentação, um refletor caído na platéia levantou fumaça e provocou um quase início de tumulto. Quando o suposto incêndio já era coisa do passado, um bombeiro adentrou a platéia, recebido com aplausos -não se sabe se sinceros ou se irônicos.
Dizem os brasilienses que tanto a acústica como a orquestra do Teatro Nacional são ok. Na terça-feira, no entanto, algo saiu errado. O som da orquestra parecia o de um velho disco da era pré-estéreo.
Seguiu-se a apresentação de "Encantamento", média-metragem de José Sette dedicado ao compositor Camargo Guarnieri. O documentário de José Sette tem a virtude de nos aproximar da obra e da figura do grande compositor. Poderia ser apresentado na TV, caso a TV não estivesse dedicada quase exclusivamente ao cultivo da subhumanidade.
Mas está longe de ser comparável a um grande filme. Sette filmou momentos preciosos: Camargo Guarnieri aparece ensaiando a orquestra (preparava em Minas o concerto de comemoração de seus 80 anos), improvisando ao piano, dando depoimento.
O conjunto, porém, atira para vários lados e padece de falta de uma unidade que consiga mostrar plenamente, a um só tempo, a força do compositor, suas convicções nacionalistas, sua identidade com a geração que, nos anos 30 e 40, sonhou redescobrir o Brasil. Está tudo lá, a rigor, mas um tanto disperso.
Os momentos em que Sette compõe pequenos poemas músico-visuais inspirados pela música de Camargo Guarnieri são de longe os mais significativos.
O som é o melhor do filme. A música é límpida. Há um momento precioso do ensaio, em que o compositor ensina ao músico a ritmação certa para que soe "mais brasileiro". No caso específico da noite de terça, a qualidade de som do filme e a firmeza da regência de Camargo Guarnieri -que morreu em 1993- tinham o inconveniente de ser imediatamente comparáveis à apresentação da orquestra brasiliense, como lembrou alguém na platéia.
Com esta noite pouco inspirada, o 32º Festival de Brasília inicia sua jornada de risco: serão 12 longas em seis dias (ao menos um terço deles não são inéditos nas principais cidades do país). Espera-se que a produção esteja à altura da aposta dos organizadores.


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