São Paulo, quinta-feira, 25 de novembro de 2004

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EVENTO

Português Boaventura Souza Santos participou de seminário no CCBB do Rio

Sociólogo critica "colonialismo global"

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

Contrariando sua habitual prolixidade, o ministro da Cultura, Gilberto Gil, falou por apenas 15 minutos, na última terça-feira, na abertura do seminário "Cultura e Desenvolvimento", que prossegue até amanhã no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio.
A estrela da noite foi o sociólogo português Boaventura de Souza Santos, 64, que pegou emprestado da curta fala de Gil a palavra "desenvolvimentora" -utilizada para evitar as conotações de "desenvolvimentista"- e a crítica à especialização excessiva.
Intelectual que se firmou como um dos mais importantes críticos da globalização, Santos pregou em sua palestra, como alternativa à hegemonia do capitalismo internacional, "a tradução intercultural e intersocial". Ou seja, o estabelecimento de reflexões e ações comuns entre movimentos populares.
"Por que, por exemplo, os movimentos dos quilombolas estão tão distantes dos movimentos dos sem-terra e dos indígenas? Todos estão lutando por terra, para reparar uma justiça histórica. Precisamos de uma ação comum, porque estamos todos em caixas e, com o tempo, elas se transformam em caixões", disse.
Para Santos, esses segmentos, assim como as mulheres e os negros, devem ter mais voz -e voz própria- na produção cultural. Segundo o sociólogo, eles oferecem um contraponto ao "conhecimento científico, que destrói, domina, desqualifica, suprime e marginaliza os conhecimentos populares, das comunidades que vivem nas profundezas das suas cidades, favelas, aldeias".
Em boa parte de sua palestra, Santos analisou o pós-colonialismo, que seria a continuidade da tradição colonialista, da qual seriam reféns "quatro quintos do mundo: América Latina, África e Ásia". Hoje essa dominação se daria, principalmente, através da economia, do mercado.
"O Banco Mundial diz que as populações da África são descartáveis, casos de ajuda humanitária, porque não são suficientemente fortes para serem exploradas pelo capitalismo. Só que o capitalismo não pode descartar toda a população, porque precisa de mão-de-obra, de mercado. Essa contradição deve ser explorada", afirmou.

Pós-modernismo
O sociólogo disse que sua reflexão sobre o pós-colonialismo é de oposição. É contra um "viés culturalista" que ressalta a importância dos bens simbólicos, mas não se preocupa com políticas de acesso a eles e à educação.
Ele também se filia à oposição quando o assunto é o pós-modernismo. Santos relativizou o banalizado conceito perguntando "como podemos aspirar ao pós se algumas sociedades estão no pré?". E ainda criticou "a melancolia pós-moderna de [Jean-François] Lyotard e os estereótipos miserabilistas do terceiro mundo de [Jean] Baudrillard".
"É um pós-modernismo celebratório. Eu prefiro, em vez de declarar o fim das utopias, reinventar utopias; em vez de eliminar a idéia de emancipação social, reinventar essa idéia; em vez da melancolia, o otimismo trágico", disse o sociólogo.
Santos -que também lançou o livro de poemas "A Escrita Inkz" (Aeroplano)- foi aplaudido de pé pela platéia, em que estavam outros participantes do seminário, como o escritor Paulo Lins ("Cidade de Deus"), o jornalista Zuenir Ventura e a crítica literária Beatriz Resende.
Nas mesas que acontecem hoje e amanhã, às 18h30, também estarão os rappers MV Bill e Nega Gizza, entre outros.


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