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DVDs- Crítica/"Don't Look Back"
Filme retrata Dylan quando idéia de celebridade não fazia sentido
Documentário de Pennebaker mostra músico em última turnê acústica, em 1965
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Na escala da cultura
pop, as quatro décadas
que nos separam de
1965 exigem a medida de anos-luz. Esta é a primeira impressão de "Don't Look Back", documentário que registra uma turnê de Bob Dylan na Inglaterra naquele ano. Além do preto-e-branco granulado das
imagens, as situações retratadas pelo exímio D.A. Pennebaker, vistas hoje, parecem um
documento arqueológico.
O uso desse termo não se
deve ao fato de este DVD ser
mera velharia indicada apenas
para nostálgicos. Ele é arqueológico porque revela um estado
de coisas na cultura pop que
deixou de existir para a eternidade. No dia-a-dia de Dylan,
astro emergente, e sua trupe,
nas rusgas de bastidores, nos
encontros com fãs, o que
"Don't Look Back" mostra é
que houve um tempo em que a
noção de celebridade não fazia
nenhum sentido.
Por mais que Dylan atue bastante, assumindo a imagem de
ídolo pop, a maioria das cenas
humaniza a tal ponto o personagem que ele acaba por se
aproximar da pessoa num grau
tal que já nos desacostumamos.
Nos bastidores, a turnê parece quase um negócio de estreantes, com seu agente sendo
obrigado a improvisar em cima
da hora teatros para as apresentações e aceitar cachês abaixo de valores de mercado, ou
seja, ainda longe da lógica industrial do espetáculo que depois se tornou dominante.
Na figura de Dylan, os rompantes de egoísmo se equilibram com situações de plena
humildade e até mesmo certo
constrangimento, quando é
obrigado a se expor aos mecanismos da fama.
E, nos confrontos com jornalistas despreparados, o artista
se esforça para tirar as muitas
máscaras que lhe são sobrepostas, tentando eliminar equívocos, como a associação de sua
imagem com a de artista folk e
cantor de músicas de protesto.
Seu esforço faz bastante sentido, considerando-se que
aquela foi a última turnê da
fase acústica de sua carreira e
que, em seguida, Dylan adotaria a ruptura elétrica que provocou certa repulsa nos fãs de
primeira hora (o que aparece
de maneira explícita em "No
Direction Home", documentário dirigido por Martin Scorsese há dois anos).
Conhecido depois como diretor de documentários musicais
hoje clássicos ("Monterey
Pop", "Ziggy Stardust and the
Spiders from Mars", "101"),
Pennebaker optou aqui por
deixar a música relativamente
em segundo plano.
"Don't Look Back" pode frustrar muitos fãs porque mostra
poucas cenas de Dylan no palco, mas a escolha faz muito
sentido, porque o que aparece
no lugar é o retrato do artista
como homem.
DON'T LOOK BACK
Diretor: D.A. Pennebaker
Distribuidora: Sony BMG (R$ 35,
em média)
Avaliação: ótimo
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