São Paulo, domingo, 25 de novembro de 2007

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DVDs- Crítica/"Don't Look Back"

Filme retrata Dylan quando idéia de celebridade não fazia sentido

Documentário de Pennebaker mostra músico em última turnê acústica, em 1965

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Na escala da cultura pop, as quatro décadas que nos separam de 1965 exigem a medida de anos-luz. Esta é a primeira impressão de "Don't Look Back", documentário que registra uma turnê de Bob Dylan na Inglaterra naquele ano. Além do preto-e-branco granulado das imagens, as situações retratadas pelo exímio D.A. Pennebaker, vistas hoje, parecem um documento arqueológico.
O uso desse termo não se deve ao fato de este DVD ser mera velharia indicada apenas para nostálgicos. Ele é arqueológico porque revela um estado de coisas na cultura pop que deixou de existir para a eternidade. No dia-a-dia de Dylan, astro emergente, e sua trupe, nas rusgas de bastidores, nos encontros com fãs, o que
"Don't Look Back" mostra é que houve um tempo em que a noção de celebridade não fazia nenhum sentido.
Por mais que Dylan atue bastante, assumindo a imagem de ídolo pop, a maioria das cenas humaniza a tal ponto o personagem que ele acaba por se aproximar da pessoa num grau tal que já nos desacostumamos.
Nos bastidores, a turnê parece quase um negócio de estreantes, com seu agente sendo obrigado a improvisar em cima da hora teatros para as apresentações e aceitar cachês abaixo de valores de mercado, ou seja, ainda longe da lógica industrial do espetáculo que depois se tornou dominante. Na figura de Dylan, os rompantes de egoísmo se equilibram com situações de plena humildade e até mesmo certo constrangimento, quando é obrigado a se expor aos mecanismos da fama.
E, nos confrontos com jornalistas despreparados, o artista se esforça para tirar as muitas máscaras que lhe são sobrepostas, tentando eliminar equívocos, como a associação de sua imagem com a de artista folk e cantor de músicas de protesto.
Seu esforço faz bastante sentido, considerando-se que aquela foi a última turnê da fase acústica de sua carreira e que, em seguida, Dylan adotaria a ruptura elétrica que provocou certa repulsa nos fãs de primeira hora (o que aparece de maneira explícita em "No Direction Home", documentário dirigido por Martin Scorsese há dois anos).
Conhecido depois como diretor de documentários musicais hoje clássicos ("Monterey Pop", "Ziggy Stardust and the Spiders from Mars", "101"), Pennebaker optou aqui por deixar a música relativamente em segundo plano.
"Don't Look Back" pode frustrar muitos fãs porque mostra poucas cenas de Dylan no palco, mas a escolha faz muito sentido, porque o que aparece no lugar é o retrato do artista como homem.


DON'T LOOK BACK
Diretor:
D.A. Pennebaker
Distribuidora: Sony BMG (R$ 35, em média)
Avaliação: ótimo


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