São Paulo, quarta, 25 de novembro de 1998

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PRÊMIO SHELL
Compositor carioca foi homenageado ontem, no Rio
Portelense Zé Keti aproveita a reverência para rever o passado

GUSTAVO AUTRAN
da Sucursal do Rio

A voz do morro ecoou no templo da MPB. O portelense Zé Keti, autor da marcha-rancho "Máscara Negra", foi homenageado ontem, durante a 18ª edição do Prêmio Shell de Música Popular Brasileira, no Canecão, no Rio.
O prêmio é concedido anualmente, desde 81, a um compositor vivo cuja obra tenha contribuído para o enriquecimento da música popular. A exceção fica por conta de Pixinguinha (1898-1973), o primeiro artista homenageado.
A cantora Fernanda Abreu, o pianista Wagner Tiso e o diretor da Sucursal do Rio da Folha, Luiz Caversan, estão entre os jurados que escolheram o homenageado deste ano.
Aos 76 anos, Zé Keti aproveita a reverência para rever o passado. "Foi um tempo difícil e ao mesmo tempo muito rico. Uma época que deve estar sempre gravada na nossa memória".
Modesto, o sambista se esquiva de qualquer responsabilidade em relação a seu sucesso. "A homenagem não é necessariamente para o sambista, mas para o samba que sempre defendi."
O compositor consagrado por seus gritos de protesto nos anos 60 era muito quieto na infância. "Zé Keti é uma variação para Zé Quietinho", explica.
² Artista multimídia
Nascido em Inhaúma (zona norte do Rio), ele foi levado pela primeira vez à Portela, em Madureira, pelo compositor Alvaiade, em 1937.
Aos poucos, Zé Keti deixou a timidez de lado e se tornou um artista multimídia. Em 1957, a vida e a obra do compositor serviram de base para o filme "Rio Zona Norte", dirigido por Nelson Pereira dos Santos.
Além disso, compôs trilhas para filmes do cineasta Roberto Santos e fez uma parceria inusitada com Cacá Diegues em "A Grande Cidade".
As músicas de Zé Keti adquiriram contorno político mais forte a partir dos anos 60. Nessa época ele comandava as noitadas de samba no bar Zicartola, no centro do Rio.
Foi Zé Keti que apresentou para o público os sambistas Elton Medeiros e um certo Paulo César - apelidado por ele de Paulinho da Viola.
Na badalação do Zicartola, o sambista conheceu Oduvaldo Vianna Filho, o Vianinha, que idealizou o show "Opinião", em 1965.
O espetáculo contou com Zé Keti, o maranhense João do Vale e a cantora Nara Leão, substituída mais tarde por Maria Bethânia. Logo ele se transformou num ícone da resistência ao regime militar.
O show reuniu no mesmo palco um representante dos morros cariocas (Zé Keti), um retirante (João do Vale) e uma carioca engajada de classe média (Nara Leão).
"Nara era talentosa e muito bonita. Pena que nunca me deu bola", diz o sambista, fiel à sua fama de mulherengo.
Autor de composições emblemáticas do samba, entre elas "Diz que Fui por Aí" e "Mascarada", Zé Keti entra para história da música popular como um dos principais elos de ligação entre as culturas produzidas no morro e no asfalto.
"Estou muito emocionado com a homenagem. Nunca é tarde para ser reconhecido."



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