São Paulo, Sábado, 25 de Dezembro de 1999


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LIVRO/LANÇAMENTOS
Montalbán e Montero reinventam livros

CYNARA MENEZES
especial para a Folha

Se é excesso ou falta de imaginação, não se sabe. Mas romances inspirados em antigas obras parecem estar na moda. O espanhol Manuel Vázquez Montalbán e o cubano Reinaldo Montero seguiram o filão. O primeiro se inspirou no filme "O Estrangulador de Boston" (Richard Fleisher, 1968) para seu "O Estrangulador"; o segundo, em "As Afinidades Eletivas", de Goethe, em "As Afinidades".
Os resultados, porém, são radicalmente opostos. Enquanto Montalbán parte de um filme popular para compor uma obra erudita e difícil, Montero se inspira no clássico e produz um livro simples e de prazerosa leitura.
Em "As Afinidades Eletivas", o alemão Wolfgang Goethe (1749-1832) reúne dois casais na residência de um deles, isolados do contato com o mundo exterior. Logo as afinidades entre macho e fêmea de pares opostos começam a se definir naturalmente, dando início ao conflito.
No romance de Montero, dois casais, decididos de antemão a trocar de parceiro por algumas noites, se hospedam em uma cabana no campo. Não há aí a diferença de idade exposta por Goethe com um dos casais de enamorados clandestinos, mas sim a inocência e até um certo pudor excessivo daquela que seria a mais ingênua do grupo, Magda.
Magda se opõe a Cristina, a mais atirada, e ao próprio marido, Bruno, ao mesmo tempo que descobre as tais afinidades com o companheiro da outra, Néstor. Como pano de fundo da tensão iminente, as divergências políticas entre os homens do quarteto, expondo as incoerências da ilha comandada por Fidel Castro.
"No romance há pontos de vista e também perguntas sem respostas. Cuba está cheia de carências", disse o escritor em entrevista à Folha, por e-mail.
Sobre sua inspiração no livro de Goethe, Montero revela bem mais uma "dívida de gratidão" com o pensamento do autor alemão. "Enquanto Goethe gasta uma grande quantidade do tempo até o momento erótico em que o casal faz amor e cada um pensa no outro, eu faço com que o sexo chegue muito rápido. Os problemas começam depois", diz.
É uma boa aposta, e funciona, com momentos que vão desde a tensão até o humor mais descarado, como quando a cubana Cristina prefere dizer, em detrimento do chavão socialista, "Viva a Revolução", "Viva a Umidade".
Vázquez Montalbán preferiu incorrer em sua formação de filósofo e fez do estrangulador interpretado no cinema por Tony Curtis um autodidata com especial interesse em pintura e psicanálise.
É um romance escrito sob a forma de diário, a meio caminho entre a ficção e o ensaio -tem até notas de rodapé-, e o autor usa páginas e páginas na interpretação de tudo quanto vê e conhece.
Em "Quarteto", pequeno romance policial, já havia se dedicado a analisar a mesma Ofélia do quadro do pré-rafaelita Everett Millais, como agora. Refere-se ainda aos zapatistas de Chiapas, cujo subcomandante Marcos é alvo de seu livro mais recente.
"O Estrangulador" é sofisticado, tenso e claustrofóbico, e é apontado por alguns críticos espanhóis como uma das melhores obras de Montalbán. Infelizmente é também um livro muito chato.

Avaliação:   


Livro: As Afinidades
Autor: Reinaldo Montero
Tradutor: Sérgio Molina
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$18,50 (124 págs.)


Avaliação:  

Livro: O Estrangulador
Autor: Manuel Vázquez Montalbán
Tradutora: Rosa Freire d'Aguiar
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 24 (210 págs.)



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