São Paulo, domingo, 25 de dezembro de 2005

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CRÍTICA

Visibilidade foi a palavra de ordem em 2005

BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA

Sinal dos tempos: os dois grandes destaques da TV em 2005 são off-Globo. Embora a TV da Gente esteja operando em caráter ainda quase experimental, só a afirmação expressa em seu slogan "a cor do Brasil" sugere a importância política da emissora. Trata-se de dar visibilidade à população negra e fazê-lo invertendo o sinal daquilo que sempre foi a tradição da TV brasileira: ocultar, disfarçar e folclorizar a presença negra. Estreou há pouco mais de um mês e sua programação enfrenta ainda enormes dificuldades operacionais, mas já representa um ponto de inflexão fundamental na história da TV brasileira.
Num ano em que a política institucional passou por uma crise inaudita, o outro destaque da TV também tem sentido mais político do que qualquer outra coisa. O monopólio da Globo sofreu mais uma fissura com o sucesso das novelas da Record. Depois de uma tentativa sem pé nem cabeça de "inovar", numa combinação de novela e "reality show" que resultou no fiasco de "Metamorphoses", a emissora acertou o passo com roteiros mais convencionais, bastante decalcados daqueles que consolidaram a liderança da Globo na ficção televisiva. Com uma pequena ajuda de uma gorda injeção de investimentos que possibilitou uma migração de atores recém-saídos de produções globais, a Record realmente emplacou uma forma alternativa, mesmo que ainda um tanto derivativa, de fazer novelas.
Visibilidade foi uma espécie de palavra de ordem da TV neste ano. A transformação da transmissão direta das CPIs pela TV Senado em espetáculo, inaugurando um voyeurismo político, mostrou um espectador interessado em acompanhar e testemunhar até mesmo as questões mais intestinais do poder.
Na outra ponta, pode-se dizer que foi um ano de orgulho gay na TV. Da torcida descarada e quase unânime para transformar o professor gay Jean Wyllis em milionário à comoção pelo beijo que não aconteceu entre os personagens Júnior e Zeca de "América", passando pela simpatia despertada pelo casal de lésbicas em sua luta para adotar um garoto em "Senhora do Destino", 2005 pode até ser considerado espécie de marco nessa área.
Na TV a cabo, o clima aterrador, o roteiro improvável e imaginativo e alguns atores de talento fizeram de "Lost" um seriado daqueles viciantes e que terá a primeira temporada exibida na Globo a partir de fevereiro. "House", com seu cinismo anguloso, sem brechas, criou uma espécie de drama às avessas, em que a simpatia pelo sofrimento humano é objeto de piada, de desprezo e sinal de fraqueza. Interessante (e os diálogos ótimos ajudam), ainda que um tantinho repulsivo.
Essa espécie de retrospectiva breve e idiossincrática não ficaria completa sem mencionar um "já foi tarde": até a conclusão desta coluna, João Kleber continuava fora do ar.


@ - biabramo.tv@uol.com.br

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