São Paulo, sábado, 25 de dezembro de 2010 |
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CRÍTICA ROMANCE Henry James promove a epistemologia do romance no rico e sutil "Os Embaixadores"
ALCIR PÉCORA ESPECIAL PARA A FOLHA "Os Embaixadores" (1903), romance do escritor nova-iorquino naturalizado inglês Henry James (1843-1916), chega ao Brasil acompanhado de um prefácio do próprio James; de um posfácio do crítico Ian Watt, que fez o caminho contrário ao dele, passando da Inglaterra aos EUA; e de uma nota final do tradutor Marcelo Pen. Não é pouca dificuldade dar uma ideia justa do livro, mesmo que, no prefácio, James afirme maldosamente que "nada é mais fácil do que apresentar o assunto". Do ponto de vista das ações, até que é: Lambert Strether, em vias de se casar com uma rica viúva de Massachusetts, dona de uma poderosa indústria, é enviado por ela a Paris com a missão de repatriar o seu filho e herdeiro, o qual fora lá a passeio e nunca mais voltara, por artes de uma libertina. O embaixador parte, e, claro, tampouco ele volta, seduzido pela cidade e pelas surpresas do caso, pois o filho bronco se transformara num belo, culto e perfeito cavalheiro. A suposta bruxa criara um príncipe! Maravilhado, Strether se dispõe a proteger o casal, o que provoca uma segunda embaixada: é enviada à caça dos fujões a filha fidelíssima da viúva, que carrega consigo o marido traste, mas também o trunfo da jovem e encantadora irmã dele, genuína pérola da Nova Inglaterra! O tom cômico e fabular, que tentei reproduzir, é fiel ao núcleo de intriga, mas o interesse do livro é bem outro. Pois ele não passa simplesmente pelas ações: ele, por assim dizer, afunda nelas profundamente, tal a riqueza sutil de análise das sensações emanadas de cada cena. Certamente há um choque cultural associado à trama romântica, mas esta apenas se entrevê por meio de presságios difusos, afeições superafetadas, diálogos crispados que insinuam e adivinham, mas nunca afirmam. Talvez se possa mesmo dizer que o segredo do romance é se tornar uma espécie de epistemologia do romance, onde a função de cada evento é produzir as condições de repensar a sua forma. Ao cabo da intriga, sabemos que o embaixador encontra enfim sua verdadeira missão, livre tanto do encargo de devolver o filho à mãe provinciana, como do dever, que tomara para si, de garantir que o filho honrasse a mulher que o fez um "esplêndido" homem do mundo. O final é pacífico, mas não triunfante. À frente de Strether, não está a vida, que já passou. Mas deixa aos jovens o exemplo generoso e didático do "erro" sem reparo de não ter sabido torná-la uma vida própria, em seu tempo. Há, enfim, o júbilo de uma dor totalmente íntima. ALCIR PÉCORA é professor de teoria literária na Unicamp OS EMBAIXADORES AUTOR Henry James EDITORA Cosac Naify TRADUÇÃO Marcelo Pen QUANTO R$ 99 (600 págs.) AVALIAÇÃO ótimo Texto Anterior: Crítica/Contos: John Cheever cria mosaico desencantado Próximo Texto: Painel das Letras Índice | Comunicar Erros |
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