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CINEMA - "TRAIÇÃO"
Fernanda Torres é destaque do filme
da Redação
Os filmes de episódios são ótimas maneiras de começar uma
carreira na direção, já que os riscos
são divididos por três, enquanto a
chance de o espectador gostar de
pelo menos um deles multiplica-se
na mesma proporção.
Ao mesmo tempo, o média-metragem coloca questões narrativas
semelhantes às do longa, distinguindo-se assim do curta-metragem. Além disso, os diretores de
"Traição" -Arthur Fontes, Claudio Torres e José Henrique Fonseca- partem da base mais sólida
que existe no Brasil: textos de Nelson Rodrigues.
Dos três episódios, o mais próximo do espírito rodriguiano é "O
Primeiro Pecado", que abre o filme. Ali, Pedro Cardoso é um homem de poucas aventuras na vida,
que em dado momento topa com
uma bela mulher casada (Fernanda Torres). À parte a ironia que vai
caracterizar o desenvolvimento do
episódio, "O Primeiro Pecado"
mostra com muita felicidade uma
instituição nacional, que é a falação entre os homens -esse hábito
de contar vantagem a respeito de
suas aventuras amorosas, mesmo
que acrescentando a elas uma boa
dose de fantasia.
O episódio é menos feliz nas sequências em preto-e-branco, que
descrevem os devaneios do protagonista a respeito da vida conjugal
da mulher em questão. Em troca,
se dá muito bem na visada do universo masculino.
"Diabólica" ganhou um polêmico prêmio de direção no último
Festival de Brasília, já que causou
estranheza o fato de um prêmio
dessa ordem ir para o diretor de
um episódio. O enredo trata do
ciúme doentio que a irmã mais velha (Fernanda Torres) sente em relação à mais nova (Ludmila Dayer), uma adolescente que dá em
cima de seu noivo (Daniel Dantas).
O roteiro, o mais bem construído
dos três, apropria-se das tensões
paradoxais próprias de Nelson Rodrigues para criar uma atmosfera
de filme de terror, em que o ciúme
da irmã mais velha projeta na mais
nova características verdadeiramente diabólicas.
Se faz um trabalho notável de direção de atores (de atrizes, sobretudo), a opção de mise-en-scène
de Claudio Torres (irmão de Fernanda) parece menos feliz. Tanto a
luz quanto o trabalho de câmera
rejeitam a tradição do filme de terror -que é mais seca, direta- e
acata a do filme publicitário.
Dá a impressão de que estamos
vendo um longo anúncio de TV
-laborioso, privilegiando os efeitos em detrimento daquilo que
tem a dizer. O que é compensado
pelos poucos segundos em que o
trabalho de Torres chega aonde
parece querer chegar: a evocação
de "O Exorcista".
Talvez isso não seja pouco. Demonstra que Claudio Torres domina bem a arte dos efeitos e que o
tempo pode bem propiciar-lhe o
resto: uma proposta mais pessoal e
um estilo mais despojado.
O terceiro episódio, "Cachorro!", de José Henrique Fonseca, é o
menos feliz dos três. O roteiro,
bastante convencional, gira em
torno de um homem que encontra
a mulher em um hotel com seu melhor amigo. De longe, o mais interessante são os momentos de humor propiciados pela intrusão de
um garçom. Em troca, os atores
não parecem inteiramente convencidos de que todo o resto da situação esteja mais para tragédia do
que para comédia, o que prejudica
o balanço entre os gêneros.
A notar, por fim, a presença de
Fernanda Torres (mais do que Fernanda Montenegro, que aparece
por poucos instantes), nos dois
episódios em que trabalha. Livre
do hábito de aparentar superioridade em relação aos personagens
que interpreta, é uma atriz como
poucas.
(INÁCIO ARAUJO)
Filme: Traição
Produção: Brasil, 1998
Direção: Arthur Fontes, Claudio Torres e
José Henrique Fonseca
Com: Pedro Cardoso, Fernanda Torres,
Alexandre Borges e outros
Quando: a partir de hoje, no Espaço
Unibanco 4, SP Market 5 e Interlar
Aricanduva 9
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