São Paulo, sábado, 26 de março de 2005

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CONTOS/"QUESTIONÁRIO"

Cadão Volpato traz forma atual para universo literário

SANTIAGO NAZARIAN
ESPECIAL PARA A FOLHA

A edição do novo livro de contos de Cadão Volpato, "Questionário", tratou-o como um objeto estreito e comprido, como um manual ou uma caderneta telefônica. Pode ser uma edição pertinente, mas não muito prática. Pelo livro ser muito estreito, a gravidade das páginas sobre a brochura não é suficiente para mantê-las abertas e é necessário usar ambas as mãos para ler. Por isso o marca-páginas destacável na orelha vem bem a calhar...
Mas tudo bem, pela sua estrutura, o livro pode até ser lido assim, quase como uma consulta. Cada conto inicia-se com uma pergunta. E são perguntas das mais bizarras. "O Que o Palhaço Fez Aquela Noite no Circo?" e "O Que É um Rico?" são alguns dos títulos que abrem narrativas-respostas de diversos personagens. Pode parecer algo muito comum atualmente. Há revistas mensais estruturadas dessa forma. Por e-mail, circulam aqueles questionários esdrúxulos com perguntas do tipo: "Que ferramenta de jardim você gostaria de ser?". Entretanto, este é o grande mérito do livro, utilizar uma forma ágil e atual a serviço de um universo verdadeiramente literário. Como as perguntas surgem fora de contexto, as respostas também são fragmentos, sem grandes pistas de onde vieram e para onde vão. Personagens contam episódios frugais, mas ganham contornos poéticos. Lembra o "ritual de escuta às vozes", andar pelas ruas e captar fragmentos de conversas alheias. Essa liberdade deliciosa de Volpato garante a unidade do livro, ao mesmo tempo em que permite exercitar diferentes estilos e realidades. E, ao contrário de muitas obras que apelam para a fragmentação como uma forma de mascarar a falta de assunto, "Questionário" parece ter ainda mais assunto do que páginas. Seus contos abrem muito mais questões do que respondem. Seus personagens mais se insinuam do que se revelam, deixando ao leitor a tarefa de completar os espaços em branco.
Fico imaginando como Volpato conseguiu terminar seu livro. Deve ser viciante, sempre com novas perguntas puxando novas narrativas. Aliás, o livro pode ser visto como uma oficina literária. Quem quiser escrever, experimente responder ao questionário do autor, começando pelo final: "Por que escrevo?". Definitivamente, esse é um questionário qualitativo.


Santiago Nazarian, escritor, é autor de "A Morte Sem Nome" e "Feriado de Mim Mesmo" (ed. Planeta)

Questionário
   
Autor: Cadão Volpato
Editora: Iluminuras
Quanto: R$ 25 (96 págs.)


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