|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CRÍTICA
Irritando o espectador
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
"Irritando Fernanda
Young": o título, em si, provoca uma espécie de vácuo. Dado
o horror da natureza ao vazio, a
gente fica se perguntando: como?
O quê mesmo? Por que irritando? Fernanda Young? Quem
mesmo? Para quê? Bem, se os termos, assim, no éter não suscitam
nada parecido com curiosidade
ou sentido e nem mesmo trazem
elementos suficientes para esboçar uma resposta, vamos ao programa (estréia hoje, meia-noite,
no GNT).
Lá está Fernanda Young, que
diz logo de início: "Esse programa foi feito para me irritar". Ah,
bom... Então está explicado. Espera lá, está? Por que é que alguém iria querer irritar Fernanda
Young? Justo ela? Ah, aparentemente é para ser... engraçado?
Sim, parece ser isso. É um "talk
show" (mais um...) em torno do
tema irritação, conduzido pelo
ego descomunal de Fernanda
Young. Como primeiro convidado, o ator Luis Fernando Guimarães. Claro, eles se conhecem e
são amigos, da época em que
Young escrevia os roteiros para a
série "Os Normais" -será que é
por isso que, por diversos momentos, a gente fica torcendo para que Fernanda Torres, finalmente, apareça?
Por que aquilo que era engraçado com Torres -que é atriz de
fato e um talento para a comédia
mais do que provado- é desenxabido com Young -que não é
atriz, apesar de pagar o mico de
fazer pequenos esquetes cômicos
entremeados à entrevista. Nesses
esquetes, a apresentadora-escritora encena situações "irritantes"
do cotidiano. Pretexto para fazer
emergir seu enorme (mas cansativo) talento para muxoxos, gestos impacientes, tiradas sarcásticas e discursos inflamados.
E volta-se à entrevista, que
prossegue, aliás, à deriva. Ela joga a isca: "Luis Fernando, o que
mais te irrita em mim?". O ator
tenta se esquivar, mas acaba por
satisfazê-la, falando de seu assunto predileto, ela mesma e sua
desfaçatez.
Ele diz de sua prepotência, ela
aumenta para megalomania e,
no fundo, essas são palavras
muito grandes para descrever
uma coisa tão minúscula -e irrelevante. A irritação de que é capaz -e mais de que se orgulha- Fernanda Young só se
aproximava do humor se amparada pela dramaturgia e pelas interpretações de "Os Normais".
Assim, em estado bruto, nem
chega a fazer sentido.
A tentativa de piada se encerra
invadindo francamente a seara
do mau gosto. No final, Young
anuncia uma atração musical.
Dois pobres coitados, vestidos
com roupas típicas, interpretam
uma canção italiana, daquelas
consideradas "ridículas", do repertório brega -e que só estão
ali para ensejar mais uma bateria
de expressões de enfado e indignação. Das duas, uma. Se é de
"verdade", trata-se de humilhação, bem ao gosto do que a TV
faz de pior e nos programas populares é chamado de baixaria.
Se é combinado, de "mentirinha", ela está chamando o espectador de trouxa. Em qualquer um dos casos, não tem a menor graça.
@ - biabramo.tv@uol.com.br
Texto Anterior: Nas lojas Próximo Texto: Novelas da semana Índice
|