São Paulo, quarta-feira, 26 de março de 2008

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Chico ri de Dona Flor e Caetano canta Amado e Caymmi

Lançamento de reedição da obra do autor baiano teve homenagens, leituras e música ontem, no Sesc Pinheiros

Músicos frustraram expectativa do público que queria vê-los juntos em evento promovido pela Companhia das Letras

Tuca Vieira/Folha Imagem
Chico Buarque deixa o palco após ler trecho do romance "Dona Flor e Seus Dois Maridos"

EDUARDO SIMÕES
SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

Como era esperado, Caetano Veloso e Chico Buarque foram os destaques do evento de lançamento da reedição das obras completas de Jorge Amado (1912-2001), pela Companhia das Letras, ontem à noite, no Sesc Pinheiros, em São Paulo.
Se, por um lado, ambos frustraram a expectativa do público, que, fartamente munido de câmeras, esperava ver os dois cantores juntos no palco, por outro envolveram a platéia, cada um de seu modo peculiar.
O carioca entrou no palco de jeans, tênis e camisa branca, com seu jeito tímido. Sentou-se à mesa para ler trecho de "Dona Flor e Seus Dois Maridos" e corou, soltando risadinhas, ao comentar o ar safado da protagonista depois que o finado Vadinho volta dos mortos.
Já Caetano, também de jeans e exibindo seu farto cabelo grisalho, cantou Dorival Caymmi ("É Doce Morrer no Mar", cuja letra é de Amado) e tropeçou na letra de "Milagres do Povo", composição sua para a trilha da minissérie "Tenda dos Milagres" (baseada em obra do escritor baiano). "Quando é para cantar uma letra do Caymmi eu faço tudo certo, nas minhas, eu erro", disse o cantor. "Isso é coisa do Jorge."
Dirigido por Vadim Nikitin, o espetáculo mesclou leituras de trechos de obras -por Chico ("Dona Flor e Seus Dois Maridos"), Milton Hatoum ("A Morte e a Morte de Quincas Berro D'Água"), e Caetano ("Mar Morto")-, homenagens -do escritor moçambicano Mia Couto e do historiador Alberto da Costa e Silva-, e dramatizações. Também foram exibidas cenas do documentário "Jorge Amado", de João Moreira Sal- les, e de um depoimento gravado pela viúva Zélia Gattai, que não pôde comparecer.
Em sua fala, Gattai lembrou que, perto de terminar "Dona Flor", Amado estava "aflito" com o desenlace da trama. Ela então sugeriu matar a personagem. O escritor se recusou e, após perder a noite escrevendo, acordou a mulher com a solução: "Ó, Zélia, essa sua amiga se revelou uma boa descarada. Vadinho voltou nu, ela dormiu com ele e Dr. Teodoro, e achou ótimo". O público aplaudiu.

Jeito açucarado
O mestre-de-cerimônias foi o ator baiano Luis Miranda. A ele, juntaram-se no palco os atores Marat Descartes, Luah Guimarãez e Edna Aguiar.
Costa e Silva salientou que o que distingue um escritor de romances de um verdadeiro romancista, como Amado, são seus personagens, "que vivem durante a leitura e depois que o livro é fechado". Já Mia Couto ressaltou que, por meio da obra do escritor baiano, "o Brasil regressava à Africa", e devolvia ao continente a fala [o português] "num jeito açucarado".
A noite acabou com Caetano contando um episódio curioso: convidado para entrevistar o escritor para "O Pasquim", ele perguntou se sua relação com o candomblé era política, ideológica, cultural ou se tinha dimensão religiosa. O escritor respondeu que, diferentemente do amigo Caymmi, não acreditava em nada. Mas que já tinha visto "muitos milagres no candomblé, milagres do povo brasileiro".


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