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São Paulo, sábado, 26 de abril de 2003

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A arquitetura do antiespetáculo



Volume traz textos fundadores dos conceitos divulgados pela Internacional Situacionista
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Em um passado não muito distante, um espectro rondou os subterrâneos da Europa. O espectro atendia pelo estranho nome Internacional Situacionista.
Não faz mal se isso não significa bulhufas a você. De certa forma, isso era parte do pacote.
Grupo de artistas, intelectuais e ativistas que orbitavam em torno do francês Guy Debord (1931-1994), os situacionistas tinham como principal bastião o combate contra o que chamavam de espetacularização da sociedade.
Eles enxergavam o universo dos homens como uma modorrenta peça de teatro na qual pouquíssimos ficavam no palco e uma multidão assistia calada na platéia.
Os "situs", como eram apelidados, defendiam a participação ativa dos indivíduos em todos os campos da vida social em uma luta contra todas as monotonias da vida cotidiana moderna.
O grupo, que começou a se aglutinar em meados dos anos 50, saiu de cena em 72, depois de acender alguns dos principais pavios do maio de 68 francês e se julgar (com a celebridade adquirida então) espetacularizado.
Herança desse período em que ajudaram a formatar os slogans dos muros parisienses, acabaram sendo mais identificados com o protesto político. Mas, por trás dos gritos de "O poder está nas ruas", havia um passado de crítica contundente das artes plásticas e do urbanismo. É essa faceta menos lembrada que agora chega às livrarias brasileiras.
Em 1º de maio será lançado no Rio, no Congresso Brasileiro de Arquitetura, o volume "Apologia da Deriva" (editora Casa da Palavra). Organizado e apresentado pela arquiteta e urbanista Paola Berenstein Jacques, o livro exibe momento decisivo da construção dos principais conceitos "situs".
Os 30 textos nele reunidos, assinados por Debord, Raoul Vaneigem (o "número 2" do grupo), Constant ou simplesmente com a rubrica Internacional Situacionista, defendem em essência "que os habitantes passassem de simples espectadores a construtores, transformadores e "vivenciadores" de seus próprios espaços".
Quase todos inéditos em português, os artigos feitos entre 1955 e 1961 batem pesado contra a arquitetura moderna de Le Corbusier e companhia, por seu racionalismo e falta de paixão. "O único papel da arquitetura é servir às paixões dos homens", defendiam na revista "Potlach".
Doutora em urbanismo pela universidade de Sorbonne, na França, Berenstein diz que é o estímulo dessa forma apaixonada de viver a cidade que a levou a organizar o trabalho. "Só a polêmica que os textos podem provocar já pode ser útil para despertar paixões, principalmente paixões dos habitantes por suas cidades", diz.


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