São Paulo, terça-feira, 26 de junho de 2007

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FERNANDO BONASSI

Aviso de saúde


A dissimulação é uma alcunha, uma doença ou uma vergonha que pode e deve ser evitada

O CIDADÃO ANDA abatido, com o estômago enjoado, o espírito enojado e o coração ressentido?
Parece ter perdido os sentidos da representação, o rigor republicano da decência e a energia, ou inocência, necessária para as tarefas mais civilizadas do dia-a-dia?
Mal... Você pode muito bem estar sendo acometido pelas seqüelas danosas da presença venenosa de certo vírus... Um agente errante e lesivo em suspensão nos ares condicionados da administração... Trata-se de um vírus suspeito em expansão... O vírus da dissimulação.
Preste muita atenção à manifestação desse vírus:
A dissimulação sustenta que qualquer coisa sem sustentação repetida à exaustão pode se tornar realidade, dependendo da vontade de perdoar dos amigos mortos que se esqueceram de deitar ou da cegueira insidiosa dos inimigos que não querem se sujar ao se enterrar.
A dissimulação é mentirosa, mas por ter imunidade como se fosse uma verdadeira autoridade e ser muito criativa em sua irresponsabilidade, é poderosa; podendo assumir formar executivas, legislativas e judiciárias escandalosas em certas instâncias fiduciárias de históricos conluios corporativos.
Que partidos e candidatos eletivos se organizam em torno de interesses comuns, isso nós já sabíamos. O que não sabíamos é o que seria feito dos interesses coletivos, pois nem mesmo os maiores vigaristas e famosos fascistas dos partidos mais burgueses recebem os corretivos moralistas de seus nobres pares entronados e imunizados contra a lei.
Aliás, estão de acordo com a lei, já que as leis, em acordo, se fizeram eles mesmos, aliás...
Aliás, política deveria ser perene, polifônica e distributiva, mas não passa de patética, pessoal e mesquinha transação furtiva em troca de auxílio moradia, tíquete refeição, barbeiro concursado, engraxate especializado, seguranças armados, contratos acertados, carro blindado, isenção postal, fiscal e senhorial, poses de pavão e verbas que pagam a execução de orgias para os casados com os patrocinadores do supermercado da construção.
Que essa construção toda seja civil é só no terno moderno que a dissimulação quer ostentar, já que parece mesmo é um golpe militar em sua capacidade destrutiva da democracia representativa e popular.
Atenção senhores empreiteiros: fiquem avisados que vossas excelências são os mais visados pelos achaques desses vírus. E será preciso ter saúde mental e moral para conservar-se intacto e sem prejuízo diante do ataque abusivo do vírus da dissimulação!
Até porque, juízo mesmo o dissimulado não tem, pois pra ele está sempre "tudo bem", vivendo na condição daquele que se passa por marido traído ou amante ofendido dependendo em boa parte, da arte, dos conselhos e da ética de seu eleitorado.
O dissimulado não é, obviamente, o único culpado de sua desagregação, tendo sido seduzido pela preguiça dos que lhes passaram a missão. Mas o dissimulado é co-responsável por aquilo que cativa, já que sua sacanagem serve de exemplo televisionado ao vivo para a malandragem estarrecida e envergonhada nos refeitórios dos presídios.
O dissimulado é assim, uma espécie de Pequeno Príncipe de Maquiavel, espalhando o fel de seus exemplos nas doces esperanças das crianças condenadas que vão votar nos futuros filhos bastardos dos bandidos.
Porque o dissimulado, esperto ou tapado, e por prezar "ser folgado", sequer acredita que sejam seus os filhos de seus próprios pecados. Seriam de todos os outros, como se fosse o apoio declarado dos eleitores corneados o que faz crescer os falos tarados dos eleitos.
Em tempo: o vírus da dissimulação vai fazer questão de se acompanhar de toda a enrolação do rito processual, defesas fantásticas baseadas em teorias de conspiração e pela embromação conveniente do foro privilegiado, pra que fique bem claro quem é que manda nessa lerda inquirição de testemunhas.
A dissimulação é uma alcunha, uma doença ou uma vergonha que pode e deve ser evitada, sob pena de contaminação dos mais ingênuos dentre os nossos irmãos...
Nem é preciso ser juiz ladrão ou ministra de Estado pra saber que muitos coitados pagarão a pensão, mas poucos relaxarão e gozarão com essas crises e crias malcriadas em profusão.


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