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CRÍTICA
Depoimentos revelam universo oculto
ESTHER HAMBURGER
CRÍTICA DA FOLHA
"Travessia do Tempo" e
"Travessia do Escuro", documentários de Dorrit Harazim,
tratam de universos pouco conhecidos, quase invisíveis, do cotidiano na metrópole paulistana.
Um com quase uma hora e o
outro, com meia hora de duração,
os filmes fotografados por Walter
Carvalho e produzidos pela Vídeo
Filmes, captam com rara delicadeza pontos de vista pessoais de
situações específicas.
"Travessia do Tempo" escrutina a rotina de José Izabel da Silva,
condenado à pena máxima, de 30
anos, 27 dos quais já cumpridos.
Punido por uma série de delitos
que incluem assalto e assassinato,
o preso enfrenta meticulosamente a lenta passagem de cada dia no
célebre presídio do Carandiru.
Além do relato pessoal colhido e
editado com empatia, o filme
apresenta mulher, companheiros
detentos do preso mais antigo,
prestes a ser transferido, e de funcionários, um dos quais participa
do debate. Os depoimentos impressionam pela amargura e naturalidade no tratamento de temas violentos, mas também pela
revelação de que o cotidiano em
um lugar "não recomendável a
ninguém", palco de revoltas, admite rotina sistemática.
"Travessia do Escuro" narra a
experiência de alfabetização de
adultos em um curso oferecido
por ONG na zona leste. O filme revela com sensibilidade a perspectiva daqueles que vivem a "humilhação" de não saber ler, que justifica uma das mais terríveis discriminações, a da ignorância.
Em uma cidade onde quase tudo exige o domínio da linguagem
escrita, o decifrar de um letreiro
ou a leitura de uma legenda de TV
aparecem como conquistas libertadoras. Pessoas de idades variadas se emocionam ao compreender o código dominante. A abordagem jornalística-antropológica
dos documentários, já exibidos
pela TV Cultura, é sugestiva e merece continuidade.
Avaliação:
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