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ÓPERA
Nova montagem tem direção cênica de Carla Camurati e Hamilton Vaz Pereira; regência é do maestro Jamil Maluf
Carmen retorna politicamente correta
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
"Carmen", de Georges Bizet
(1838-1875), uma das óperas mais
populares e mais frequentemente
encenadas do repertório lírico, estréia hoje em São Paulo, no teatro
Alfa, em temporada de sete récitas, com a Orquestra Experimental de Repertório e direção musical de Jamil Maluf.
O espetáculo foi concebido por
Carla Camurati, que assina a direção cênica em companhia de Hamilton Vaz Pereira. A cigana espanhola -mulher fatal que seduz
o policial Don José, abandona-o
pelo toureiro Escamillo e acaba
assassinada pelo ex-amante- é
encenada com a mesma visão
modernizante que predominou
nas produções politicamente corretas dos últimos 30 anos.
Nada que pudesse chocar a moralidade burguesa, conforme
ocorreu na fracassada estréia do
espetáculo, na Paris de 3 de março
de 1875, na Opéra Comique. O
público, habituado a personagens
históricos ou míticos, visivelmente torceu o nariz para algo muito
próximo de sua experiência -o
adultério!- cotidiana.
Na direção de Camurati, Carmen já é punida pelo enredo que
lhe tira a vida. Deve então se tornar, como contrapeso, a encarnação positiva da mulher que exerce
naturalmente o direito à liberdade amorosa. No imaginário europeu do romantismo, vale a pena
lembrar, a sexualidade tinha por
pátria e sede a Espanha.
De certo modo, Carmen é atemporalizada pelos cenários de J. C.
Serroni, em que estruturas metálicas evocam de forma apenas sutil e indireta a cidade de Sevilha,
em que a ação originariamente se
passa ao redor de 1820.
O resultado dessa concepção
não é sempre convincente. É como se a cenografia e nela a direção
cênica escapassem ao verossímil
geográfico, mas ficassem a meio
caminho ao escolherem uma concepção abstrata.
Há, como pontos fortes, a rígida
marcação de movimentos dos solistas, do Coral Paulistano e do
Coral Infantil Eco, com achados
de extrema delicadeza, como na
cena do primeiro ato na qual a cigana utiliza, para envolver o corpo de Don José, a mesma corda
com que ele deveria levá-la, após
uma briga, à prisão.
No papel-título revezam-se Luciana Bueno (em cinco récitas) e
Rita Medeiros (em duas). O
amante rejeitado será encenado
pelo mexicano Fernando de la
Mora e por Marcello Vannucci.
Micaela, a namorada que Don
José abandona para acompanhar
Carmen ao mundo clandestino
dos contrabandistas, terá no primeiro elenco a coreana radicada
nos Estados Unidos Yunah Lee.
A grande surpresa está na Micaela do segundo elenco, Guiomar Milan. É uma cantora de 19
anos, aluna desde os 15 de Leilah
Farah, dona de um magnífico
timbre grave e de uma técnica de
respiração e "legato" que flui com
espantosa espontaneidade. Anotem o nome dela. Está nascendo
com certeza uma grande estrela
operística brasileira.
Há por fim a Experimental de
Repertório, uma orquestra municipal de jovens bolsistas que se
comporta com a retidão musical
de poucos outros conjuntos sinfônicos brasileiros.
CARMEN - ópera de Georges Bizet em
três atos. Onde: teatro Alfa (r. Branco de
Andrade Filho, 722, São Paulo, tel. 0/xx/
11/5693-4000). Quando: terça a sábado,
às 20h30; domingo, às 17h; até 6/10.
Quanto: de R$ 40 a R$ 170.
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