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Dias de Ira
da Equipe de Articulistas
"Dias de Ira" (1943) é uma história de amor e bruxaria, inspirada
em romance do escritor dinamarquês Wilhelm Jensen (1873-1950),
que no ano seguinte ganharia o
Nobel de literatura.
No século 17, Martin (Preben
Lerdorff-Rye), filho do pastor Absalon Pedersson (Thirkild Roose),
apaixona-se por sua madrasta, a
jovem Anne (Lisbeth Movin).
Filha de uma bruxa, Anne é acusada de também ser bruxa e de
causar, pela força do pensamento,
a morte de Absalon, para ficar com
o enteado.
Uma história poderosa, que Dreyer conduz com tanta sutileza e
equilíbrio que, ao fim, todas as leituras são possíveis: a mística (a
bruxaria matou Absalon), a realista (sua morte foi natural) e a romântica (ele foi morto pelo amor).
Mas não é propriamente o enredo que faz de "Dias de Ira" uma
das obras-primas do cineasta dinamarquês Carl Theodore Dreyer
(1889-1968), e sim a perfeição de
sua construção plástica e rítmica.
Como notou o crítico francês
André Bazin, Dreyer -um dos
maiores estetas da história do cinema, ao lado de Murnau e Eisenstein- busca e alcança aqui, "graças a uma admirável ciência das luzes e do enquadramento", o estilo
da pintura flamenga.
De fato, não são poucos os momentos do filme que sugerem um
Rembrandt em preto-e-branco e
em movimento: travellings e panoramas sutis, longos planos-sequência que procuram menos expor o ambiente que revelar o estado de espírito dos personagens.
Tudo, na imagem de Dreyer, são
portas para a alma: os rostos dos
personagens, captados em pormenor e sem maquiagem, a cenografia austera, os gestos hieráticos, o
ritmo cadenciado.
No singular "realismo espiritual" do cineasta, nada -palavra,
objeto, gesto ou nota musical- é
supérfluo ou ornamental.
Esse mundo de extrema depuração formal aponta para a abstração
geométrica: na calma quase monótona dos movimentos horizontais,
o drama desponta aqui e ali na forma inesperada de um elemento
vertical (uma porta, uma escada,
um corpo humano), assim como
um grito instaura de repente o pavor em meio à aparente serenidade
dos diálogos sussurrados.
O filme todo é perfeito, mas cabe
destacar alguns momentos, como
a panorâmica que expõe alternadamente os rostos dos amantes
Anne e Martin diante do caixão do
pastor e a nudez da velha bruxa
(Marthe Herloff), considerada por
François Truffaut o mais belo nu
de todo o cinema ("o menos erótico e o mais carnal").
Inédito nos cinemas brasileiros,
"Dias de Ira" é, ao lado de "A Paixão de Joana D'Arc , "Vampyr" e
"Ordet - A Palavra", uma das obras
máximas de Dreyer.
Pena que na fita lançada pela
Continental as legendas omitam
metade dos diálogos, a imagem esteja trêmula e o som cheio de ruídos indesejáveis.
(JGC)
²
Vídeo: Dias de Ira
Produção: Dinamarca, 1943, 95 min.
Direção: Carl T. Dreyer
Elenco: Thirkild Roose, Lisbeth Movin,
Preben Lerdorff-Rye
Lançamento: Continental (tel. 011/287-2696)
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