UOL


São Paulo, quarta-feira, 26 de novembro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LITERATURA

Projeto em CD-ROM traz experimentos virtuais de 12 "matrizes" com a intenção de provocar a linguagem

Poesia digital busca seu papel em "cortex"

MÁRVIO DOS ANJOS
DA REDAÇÃO

Lançada em CD-ROM, a revista "cortex", que traz trabalhos de poesia em linguagem digital, é definida como "pós-utópica" pelos seus editores, os poetas Lucio Agra, Thiago Rodrigues e o músico e designer Guilherme Ranoya. Não querem lançar um movimento iconoclasta, mas pretendem "provocar a linguagem".
"Não é que nós desmerecemos o papel. Ele tem a sua função. Acreditamos, porém, que a poesia digital pode abrir novas vias que não a do papel", afirma Thiago Rodrigues, 26.
Por meio de experimentações que envolvem o uso de palavras, imagens e sons em trabalhos que surgem ou por programação em flash ou pelo uso de links (hipertexto), a "cortex" apresenta poemas de 12 "matrizes" -uma delas é a parceria entre Rodrigues e Ranoya, que se apresentam juntos como R2.
Estão presentes na revista, além dos editores, trabalhos de poetas como Arnaldo Antunes, André Vallias -que venceu recentemente o Prêmio Sergio Motta de literatura/poesia digital-, Lenora de Barros e o americano Chris Funkhouser, entre outros.
Além de propor novos caminhos para a poética visual e para a poesia em geral, a proposta da "cortex" é a de garantir espaço e respeito para a vertente digital.
"O panorama poético tende a ser conservador e lida com a poesia visual e, principalmente, a digital, como uma coisa pueril, quando não é isso. Poesia digital é uma coisa séria", diz Rodrigues.
Segundo ele, é também um desafio. Por estar intimamente relacionada com o desenvolvimento de novas tecnologias, a poesia se torna às vezes vítima das dores-de-cabeça típicas da informática.
"A falta de padrão entre as máquinas é uma dificuldade. Às vezes você programa tudo e fica perfeito numa máquina, mas pode ser que não rode num outro computador", diz Rodrigues. Por outro lado, esses obstáculos acabam se tornando matéria-prima de metáforas da poesia digital.
No poema "Almost Lost in São Paulo", de Jorge Luiz Antonio, o corpo do poema é um texto em que algumas palavras são links para imagens em outra página, tem um erro premeditado de "página não-encontrada".
Mas nem todos os poemas foram concebidos diretamente para o suporte visual. Rodrigues afirma que os de Arnaldo Antunes e Lenora de Barros, por exemplo, já existiam em papel, mas abriam a possibilidade de uma adaptação para a poesia em movimento.
"O próprio [poeta concretista] Augusto de Campos hoje já está animando seus poemas concretos em flash. O "Plano Piloto da Poesia Concreta" já concebia esses formatos em 1958, só não tinham o suporte técnico para isso", afirma Rodrigues.
A relação com o concretismo não é negada. "O Lúcio [Agra], o Guilherme [Ranoya] e eu nos conhecemos quando levávamos adiante essas experimentações concretistas", declara.
Além disso, a "cortex" conta com músicas do filho de Augusto de Campos, Cid Campos. Para Rodrigues, porém, não há uma intenção de seguir o movimento.
"Temos um parentesco com a poesia visual, que não se restringe ao concretismo. Não faz muito sentido para mim herdar uma discussão que não é nossa", diz, fugindo de intenções dogmáticas.
Segundo os editores, "cortex" deve se tornar anual, mas não é garantido que saia sempre em CD-ROM. Pode ser que, até lá, surja uma nova linguagem.


CORTEX. Lançamento da revista de poesia digital em CD-ROM, com poemas de Arnaldo Antunes, Lenora de Barros, R2 e outros. Quando: hoje, às 20h30, no ampgalaxy (r. Fradique Coutinho, 352, Pinheiros, SP, tel. 0/xx/11/3085-7867). Entrada franca. Preço do CD-ROM: R$ 15. www.darkside.com.br/cortex.


Texto Anterior: Cinema: Cacá Diegues cria empresa audiovisual
Próximo Texto: Análise: Religião toma conta do horário nobre
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.