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Isabel Allende ataca de Zorro
Escritora chilena romanceia a lenda do justiceiro mascarado a partir um ponto de vista feminino
Autora faz leitura politicamente correta da trama e transforma o tradicional servente do herói em seu companheiro
SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL
É característico da chamada
"pulp fiction" emprestar seus
personagens a diferentes releituras e suportes. Com Zorro
nunca foi diferente. Desde que
o mascarado justiceiro surgiu
pelas mãos de Johnston
McCully, em 1919, no livro "A
Maldição de Capistrano", sua
capa escura e máscara típicas já
foram vestidas por muitos no
cinema (leia ao lado) e na TV,
além de invadirem os quadrinhos e até os videogames.
Mas, se até aqui toda essa
vulgarização foi positiva para o
personagem, desta vez Zorro
está seriamente em perigo.
Cansada de escrever best-sellers "para mulheres" -também aproveitando o crescente
mercado hispânico dos EUA-,
a escritora chilena Isabel Allende agora investe no público
adolescente (é sempre bom
cultivar para o futuro).
Em "Zorro - Começa a Lenda", ela romanceia, de forma
piegas e politicamente correta,
a lendária história de Diego de
la Vega, o filho de um proprietário de terras espanhol e uma
indígena, que, de modo quixotesco, pregava a justiça a seu
modo (e deixava a marca "Z"
feita pela sua espada no peito
dos inimigos), na Califórnia do
fim do século 18 (quando a região era colônia espanhola).
Em entrevista à Folha, por e-mail, Allende, 64, disse que não
estava interessada no personagem até que a Zorro Productions (que detém os direitos sobre sobre o personagem) a procurou para que ela escrevesse
um romance sobre o herói.
"Eles acharam que eu faria
um bom trabalho porque já tinha escrito aventuras históricas. Além disso, eu conheço a cultura hispânica muito bem."
Por conhecer a cultura hispânica, Allende provavelmente deve estar se referindo ao fato de morar há quase 20 anos em
San Rafael, na Califórnia, e de
ter tentado emular Gabriel
García Márquez no fraquíssimo "A Casa dos Espíritos",
uma mistura de realismo mágico com enredo de novela da
Glória Pérez.
"Zorro" é narrado a partir do
ponto de vista de uma mulher,
Isabel de Romeu. "Contar a
história por meio da voz de
uma jovem, que poderia ver
Zorro com humor, gentileza e
admiração, me ajudou a acertar
o tom que queria para o herói.
Ele tem qualidades, mas também é arrogante, histriônico e
impulsivo." Só faltou dizer que
a tal "perspectiva feminina"
ajudou Allende a se livrar de
um problema incômodo, o excesso de violência, inevitável
no ambiente da lenda, além de
manter a conexão com as suas
tradicionais leitoras.
Originalidade
O toque de originalidade que
Allende deu à lenda foi transformar o criado indígena de
Zorro, Bernardo, em irmão de
leite do herói. "Nas outras
adaptações, Bernardo era apenas o servente. Era tratado de
forma muito racista. Por isso,
decidi lhe dar orgulho e dignidade." Allende mostra, aqui,
que também ela pode deixar
sua marca de justiceira...
Uma das escritoras latino-americanas de mais sucesso
hoje, Allende já vendeu mais de
35 milhões de cópias de seus
romances -"A Casa dos Espíritos" (1982) e "De Amor e de
Sombras" (1984) estão entre os
mais famosos. No Brasil, foram
mais de 400 mil volumes.
Nascida no Peru, de família
chilena -Salvador Allende era
seu tio-avô-, Allende não gosta
de fazer comentários sobre política, mas contou que gostou
muito da eleição da socialista
Michele Bachelet no Chile. "Ela
nomeou 50% de mulheres em
cada nível do governo. Pela primeira vez na história, há energia feminina na administração
do país. Espero que isso faça diferença." Se não fizer, os chilenos já sabem, ainda podem apelar a seu Zorro de saias...
ZORRO - COMEÇA A LENDA
Autora: Isabel Allende
Editora: Bertrand Brasil
Quanto: R$ 52 (417 págs.)
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