|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ARTES PLÁSTICAS
Mineira Rivane Neuenschwander é primeira brasileira convidada a expor no Palais de Tokyo, em Paris
Mostra estimula troca entre coisas e formas
ALCINO LEITE NETO
DE PARIS
O Palais de Tokyo, principal espaço de arte contemporânea de
Paris, apresenta a partir de hoje a
sua primeira exposição de um artista brasileiro. Rivane Neuenschwander foi a escolhida. A exibição
leva a um patamar alto a expressão internacional desta mineira
de 35 anos, descendente de suíços,
revelada em 1994 pelo projeto
"Antarctica Artes com a Folha".
A exposição "Superficial Resemblance" (Semelhança Superficial) será aberta hoje para o público numa área de 250 m2, organizada com seis trabalhos -quatro
deles inéditos. O convite para que
Rivane expusesse no Palais de
Tokyo (www.palaisdetokyo.com), feito pelo diretor Jérôme
Sans, aconteceu antes mesmo da
inauguração do espaço, em janeiro de 2002.
Grandes caixas de madeira estavam espalhadas pelo local na última terça-feira, com os trabalhos
que Rivane trouxe do Brasil. Ela
abre uma delas e mostra cem desenhos da Torre Eiffel feitos por
não-artistas. Nos últimos dois
meses, ela montou uma "banca"
em faculdades de Belo Horizonte,
onde anunciava: "Compro desenhos da Torre Eiffel por R$ 1".
"Os desenhos são a memória ou
a imaginação que as pessoas têm
da Torre Eiffel", diz Rivane. Eles
fazem parte de "Ici Là-bas Aqui
Acolà", composto também de
uma escada de metal que leva o visitante até o alto de uma janela de
onde ele pode avistar um pedaço
da verdadeira Torre Eiffel.
De outra caixa, ela tira 50 sacolas populares de feira. Elas compõem a surpreendente série "- - - - - - - - - - Product of", um trabalho decididamente pictórico de Rivane.
Das sacolas que traziam anúncios de produtos, com ilustrações
"naives", frases e marcas, ela limpou com tíner tudo que era palavra, mantendo apenas os desenhos figurativos ou geométricos,
os quais reforçou com tintas da
mesma cor que o original.
O resultado é extraordinário. As
imagens flutuam sobre a superfície branca das sacolas, cuja textura plástica parece uma tela rústica.
Elas expõem figurações provincianas ao lado de formas abstratas, como se tentassem conciliar o
pop brasileiro com a arte construtiva-concretista, acrescentando a
ambos questões contemporâneas. A obra pode se transformar
num marco da pintura brasileira.
Outro trabalho inédito da artista é "I Wish Your Wish" (Eu Desejo o Seu Desejo), na entrada da
mostra. Ao longo de uma parede,
ela afixou centenas de fitinhas, como as do Senhor do Bonfim, em
várias cores, onde estão impressos 40 desejos que foram confiados a ela por outras pessoas.
"Eu desejo dizer um sim incondicional", diz uma das fitas. O visitante poderá levar uma fita, se
quiser. "Eu queria que as pessoas
carregassem o desejo do outro. O
desejo da gente é um pouco o desejo do outro", diz Rivane.
As pessoas carregarão o desejo
alheio como os peixes carregam
palavras de uma carta de amor no
vídeo "Love Lettering" (Escrevendo Cartas de Amor), realizado pela artista no ano passado, com o
seu irmão, o neurologista Sergio
Neuenschwander. O vídeo é um
dos destaques, exibido numa área
que a artista pintou de azul.
São azuis também os canudos
(de refrigerantes) que compõem
uma escultura realizada por Rivane. A escultura se estende, com
sua forma fractal, de uma mesa
"de boteco" até outra mesa, encontrando então uma escultura
parecida feita com canudos vermelhos. "São como duas pessoas
conversando uma conversa confusa", diz Rivane.
São como duas formas semelhantes que conversam, ou tentam se corresponder. Um desejo de correspondência, de enlace,
entre coisas e formas e entre imaginários e experiências dá o tom.
Um desejo apenas, uma promessa
talvez, pois a arte não vive de utopias. Rivane produz semelhanças
na superfície para trazer à tona as
diferenças intransponíveis.
Texto Anterior: Patrimônio: Gil quer criar museus e parque cultural fora do eixo Rio-São Paulo Próximo Texto: Frases Índice
|