São Paulo, sexta-feira, 27 de fevereiro de 2004

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Preto no branco

Reprodução
A capa estilizada de "The Grey Album', com Jay-Z e os Beatles



Produtor nova-iorquino funde instrumental do clássico "álbum branco" dos Beatles com os vocais de "The Black Album", do rapper Jay-Z

Gravadora que tem os direitos das músicas do quarteto britânico proíbe as vendas do disco, mas o "álbum cinza" já circula na internet



THIAGO NEY
DA REDAÇÃO

Uma idéia simples e, até certo ponto, óbvia, que nasceu pequena, tornou-se ao mesmo tempo um dos melhores produtos e uma das grandes celeumas da história recente da música pop.
A idéia: juntar os vocais do "disco preto" do rapper americano Jay-Z ("The Black Album", de 2003) com a instrumentação do "disco branco" dos Beatles ("The Beatles", de 68, popularmente conhecido como "álbum branco").
O produto: "The Grey Album" (apropriadamente, "disco cinza"), parido por Brian Burton, um nova-iorquino de 25 anos conhecido como Danger Mouse.
A celeuma: a gravadora EMI, proprietária dos direitos autorais das gravações dos Beatles, enviou uma carta a Burton proibindo a comercialização do álbum.
Resultado: o "disco cinza" saiu das lojas, mas chegou aos programas de troca de arquivos de MP3 da internet, a história ganhou as páginas de jornais como "New York Times" (EUA) e "Guardian" (Inglaterra) e gerou protestos de de ONGs ligadas à música.
O caso iniciou-se em janeiro. Danger Mouse (que lançou "Ghetto Pop Life" em 2003), trancou-se num estúdio por duas semanas e meia para produzir um disco que unisse "The Black Album" com o "álbum branco". "Não era nada sério. Queria fazer algo bom, que pudesse mostrar para meus amigos", disse Burton à Folha, por telefone.
Jay-Z havia lançado uma versão de seu disco apenas com o vocais, liberando o uso das faixas. "Estava brincando com essas versões e um dia, ouvindo o "álbum branco", vi que poderia sair algo interessante juntando os dois. Queria algo natural, nada forçado."
Após as duas semanas e meia, o "disco cinza" ficou pronto: todas as músicas têm os vocais do "Black Album", e toda a instrumentação (batidas de bateria, linhas de baixo, guitarra, ruídos...), vem do "álbum branco". Burton prensou 3.000 cópias em vinil (uma metade foi distribuída; a outra foi às lojas). O lançamento não gerou alarde (o álbum não chegou a esgotar), mas mesmo assim a EMI enviou o comunicado a Burton solicitando o recolhimento das cópias do álbum em circulação. O produtor atendeu, mas não havia como impedir que as músicas fossem parar na internet.
Na última terça, pelo menos 400 sites participaram de um protesto on-line liderado pela Downhill Battle, uma ONG de "ativistas musicais" que defende o direito à troca de arquivos de MP3. Foi batizado de "Grey Tuesday" ("terça-feira cinza"; www.greytuesday .org), e todos os seus participantes disponibilizaram o "disco cinza" para download -a ONG afirma que o equivalente a 100 mil cópias do disco foram "baixadas".
"Essas pessoas dizem que a EMI tenta impedir um trabalho artístico, mas não entendem que existe um mercado legal que negocia samples [trechos de música], e o sr. Burton não faz parte dele", disse a porta-voz da EMI, anteontem no "New York Times".
De seu lado, os ativistas afirmam que as leis de direito autoral estão defasadas, e que é necessário uma revisão. Geralmente, quando um artista utiliza sample de outro, chega a ceder até 50% dos direitos da música criada.
A questão legal foi resolvida: não haverá processo judicial. Mas o "disco cinza" está na net, com os vocais de Jay-Z sobrepostos a melodias de "Helter Skelter", "While My Guitar Gentle Weeps", etc.


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