São Paulo, terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

análise

Oscar muda e se rende ao diretor

SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

Fala-se muito nos "critérios de premiação da Academia" como se eles fossem fossilizados, fruto de universo reduzido de eleitores. Na verdade, cerca de 6.000 profissionais, com diferentes formações e predileções, integram a instituição, que está em constante processo de renovação.
A cada ano, por exemplo, ingressam no sistema todos os indicados ao Oscar e saem os mortos. Além disso, muita gente com direito a voto prefere se manter à margem da eleição (por não se sentir motivado a participar) ou "pular" algumas categorias. Só os auditores têm idéia concreta dos números. E nunca os revelam publicamente.
Logo, a Academia que preteriu Martin Scorsese nos anos 70 (quando nem mesmo foi indicado por "Caminhos Perigosos" e "Taxi Driver"), 80 (na risível derrota de "Touro Indomável" para "Gente Como a Gente") e 90 (quando "Os Bons Companheiros" perdeu para "Dança com Lobos") já não existe.
Aquela era composta por pessoas majoritariamente mais velhas do que o próprio Scorsese, vindas de uma Hollywood muito diferente e ainda sonhando com ela. A atual reúne diversas gerações posteriores à de Scorsese, para as quais ele, Francis Coppola, Steven Spielberg e George Lucas são, por motivos distintos, ídolos. Velhinhos adoráveis, porque um dia representaram a rebeldia.
Examine-se "Os Infiltrados" à luz da Academia dos anos 70 e 80, e ele seria ignorado por razões objetivas e pueris: corre muito sangue, morrem quase todos os personagens principais (uma das traduções para "The Departed" é "os finados"), não há boa "mensagem", apenas a constatação de que o mundo é selvagem, injusto e cheio de ratos.
Décadas depois, com a indicação de "Pulp Fiction" (1994) ao Oscar de melhor filme no meio do caminho, as mesmas razões -que ajudaram a transformar "Os Infiltrados" em sucesso internacional de bilheteria- estão no pólo oposto.
Violência não é problema em si, morte de protagonistas gera deleite especial e ceticismo diante da sociedade de consumo e é o mínimo a esperar de um filme com neurônios. Refilmagem de um policial sangrento oriental? Tanto melhor. É procedimento "cult".


Texto Anterior: Isto é Scorsese
Próximo Texto: Mônica Bergamo
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.