São Paulo, sábado, 27 de fevereiro de 2010

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Wilfredo Lam traduz a selvageria em gravuras

Artista cubano tem mostra com 200 obras em SP

SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL

Num olhar rápido, parece fingido o caráter ancestral, primevo, das figuras de Wilfredo Lam. Desenhadas no vazio ou emolduradas pela cor vibrátil, lembram o cubismo de Picasso e suas máscaras africanas.
Só lembram, já que traduzem a vanguarda europeia para os trópicos. Cubano radicado em Paris, filho de pai chinês e mãe mulata da ilha, Lam foi o ser híbrido que se transmuta em suas gravuras, 200 delas agora em mostra na Estação Pinacoteca.
São mulheres desconjuntadas, cavalos, anêmonas, massacres, pássaros arrepiados ou retilíneos, touros, espingardas, colunas espinhosas, insetos geométricos, faces e olhos vazados, um parto às avessas. Não é o exótico aclimatado que orienta seu mundo pendular, entre hostil e feérico. Lam extrai a selvageria da própria carne. Plasma em seus traços, como que fraturas expostas, a realidade tropical que europeus retrataram sempre mistificada, com pegada maneirista.
Em suma, seus pássaros-máquina, pássaros-dragão, aves-geringonça, o zunido infernal de porcas, parafusos e arestas, mostram uma "intuição primitiva", o "orgulho da ferocidade", nas palavras do curador da mostra, Paulo Venancio Filho. Emprestou suas linhas para ilustrar os versos dos surrealistas e depois a realidade fantástica de Gabriel García Márquez.
Na série "El Último Viaje del Buque Fantasma", enxuga detalhes, engrossa os contornos e afoga texturas na cor que se torna mais violenta. Tudo flutua num vazio envoltório, ou espaço de diluição luminosa.
Foi a síntese que veio depois de obras mais complexas, em que Lam expõe vísceras de criaturas alternando camadas de transparência. Deixa ver através da pele uma dor latente, a digestão renhida que turbina um espocar de manchas do lado de fora. No rosto das criaturas, grandes olhos vazios engolem tudo que está fora do quadro.


WILFREDO LAM

Quando: abertura hoje, às 11h; de ter. a dom., das 10h às 18h; até 2/5
Onde: Estação Pinacoteca (lgo. General Osório, 66, tel. 0/xx/11/ 3335-4990)
Quanto: R$ 6




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