São Paulo, sábado, 27 de março de 2004

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O PODER DA FANTASIA

Ilustrador de "O Senhor dos Anéis", Alan Lee analisa o "revival" de lendas nórdicas e arturianas

Feras e mitos criam "playground seguro"

DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL

Reza a lenda que poucos artistas, nem mesmo o próprio autor, que também arriscava as suas pinceladas, retrataram com tamanha fidelidade o universo criado por J.R.R. Tolkien (1892-1973) em "O Senhor dos Anéis" como o ilustrador inglês Alan Lee, 57.
Autor, entre outras, das aquarelas que acompanham as edições de luxo da Martins Fontes, Lee foi o escolhido por Peter Jackson para dar "a cara" da adaptação da trilogia para o cinema.
"Eu não tinha idéia que o filme estava sendo feito até receber pelo correio um pacote, com dois vídeos, "Almas Gêmeas" [94] e "Forgotten Silver" [95]. Era o final de 1997. Peter ressaltou o que queria e me convidou. Já tinha ouvido falar bem dele, mas fui assistir aos vídeos e, em janeiro de 98, estava pegando o avião para cá", contou Lee em entrevista por e-mail à Folha, da Nova Zelândia.
Juntamente com os de John Howe, outro conhecido ilustrador de Tolkien, seus desenhos inspiraram os cenários da superprodução -mais ainda, as encarnações "reais" de Frodo, Sam, Galadriel e Gollum parecem ter criado vida a partir das pinturas de Lee.
Especializado em retratar os mitos do folclore nórdico, sua estréia oficial foi no clássico "Faeries" (1978), de David Larkin, em que divide as ilustrações com o colega Brian Froud. Além de versões da "Ilíada" e da "Odisséia", Lee ilustrou muitas das chamadas lendas arturianas, entre elas, a saga "O Único e Eterno Rei", de T.H. White (1906-64), que a editora W11 começa a trazer agora ao Brasil, com o lançamento da primeira parte, "A Espada na Pedra".
"Tomei contato com "A Espada na Pedra" antes de conhecer "Senhor dos Anéis". Há paralelos óbvios entre os dois: a passagem, por meio de provas e perigos, de uma vida rural e inocente para um papel predestinado de responsabilidade. A semelhança entre Gandalf e Merlin, como as forças motrizes da mudança, os xamãs. O sentimento de perda e melancolia que permeia as duas histórias..."
"A Pedra na Espada" narra os primeiros anos da vida de Wart -que, no futuro, e depois de conseguir arrancar a espada da pedra em questão, se torna o lendário rei Arthur-, além do seu encontro com o mago Merlin. Magos, corujas, espadas, cavaleiros, enfim, uma série de elementos que fazem todo o sentido hoje dado o sucesso de franquias como "Senhor dos Anéis" e "Harry Potter".
"O fato de serem recheadas de feras estranhas e de personagens semi-humanos só acrescenta charme a essas histórias", opina Lee, quando questionado sobre o retorno da fantasia à sala de jantar. "O central nisso tudo são as relações entre os personagens e o seu crescimento ao longo de suas jornadas. São um playground seguro, no qual todos os papéis que tomamos como seriamente desafiadores na vida real podem ser simbolicamente representados e trabalhados. São menos uma fuga da realidade e mais uma preparação para ela. Veja só: se esse fosse o caso, eu deveria estar soberbamente preparado para a vida real, mas definitivamente não estou!"
"Especialmente agora que comecei a pensar em mudar de volta à Inglaterra, tendo de lidar com toda a bagunça que se acumulou nesses seis anos em que estive nessa jornada mágica extraordinária... Bem, depois de um feriado e de uma boa limpeza na casa, certamente voltarei para os meus livros. Pelo menos até a chegada o próximo pacote misterioso", diz.


A ESPADA NA PEDRA. De: T.H. White. Arte: Alan Lee. Lançamento: W11 Editores. Quanto: R$ 37,80 (312 págs.).


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