São Paulo, sábado, 27 de maio de 2000


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Solano Ribeiro, que dirigiu o 7º FIC, revela agora que emissora cedeu a pressões externas
Diretor do evento contesta a versão de que a rede de TV quis prejudicar a música "Cabeça", de Walter Franco
Militares regeram festival de música da Globo em 72

Dado Galdieri/Folha Imagem
Solano Ribeiro, diretor do 7º FIC da Globo, durante entrevista


CARLOS BOZZO JUNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

O mesmo homem que organiza atualmente o Festival de Música Brasileira da TV Globo está dizendo que a emissora sofreu e acatou pressões militares em outro festival que ele dirigiu, nos anos 70.
Solano Ribeiro de Faria, 61, diz que destituiu o júri do 7º Festival Internacional da Canção (FIC), em 1972, numa tentativa de deixar claro que militares pressionaram a Globo a afastar Nara Leão (1942-1989) do corpo de jurados.
Ribeiro não teve sucesso. Todo o júri, presidido por Nara, foi mudado, mas a versão que circula até hoje é que uma manobra comercial, e não política, da TV Globo provocou a substituição dos jurados. É isso que sustentam dois dos integrantes do júri destituído, o maestro Rogério Duprat e o poeta Décio Pignatari. Segundo eles, a emissora teria interesse que a música "Cabeça", de Walter Franco, não fosse a campeã.
A história voltou à tona por conta do documentário "Walter Franco Muito Tudo", de Bel Bechara e Sandro Serpa. No filme, premiado no recente festival É Tudo Verdade, Duprat reafirma o complô contra Franco.
"Hoje sou obrigado a falar, porque, 28 anos depois, existem ainda pessoas que persistem na tese de que aquilo foi manobra da Globo para derrotar o Walter Franco, o que é uma grande bobagem."
Ribeiro explica: "Na época, o Walter Clark me disse, sem dar nomes, que havia chegado na Globo uma exigência dos militares para que Nara fosse afastada do júri". Contrariado, Ribeiro pediu demissão, que não foi aceita.
"Após uma noite inteira de pressão, fraquejei, mas impus uma condição: "Eu fico, mas não sai só a Nara, sai todo o júri"."
Ribeiro acreditava que, assim, criaria um "fato político" e tornaria pública a pressão dos militares. Ele não comunicou a ninguém o motivo real da mudança.
"Não poderia expor a Globo a uma bravata de minha parte. Esperava que alguém fosse atrás, e aí a coisa seria desvendada, mas o foco de atenção se desviou."
"Fio Maravilha", do então Jorge Ben, cantada por Maria Alcina, e "Diálogo", de Baden Powell e Paulo César Pinheiro, foram as escolhidas por um segundo júri, que tinha Joachim Berendt, da Alemanha, Alain Debray, da Argentina, e Zhoichi Yui, do Japão.

Nara
Solano Ribeiro não está sozinho nessas suas argumentações.
João Luis Albuquerque, assessor de imprensa do 7º FIC, fala: "Uma entrevista da Nara ao "Jornal do Brasil" desagradou aos militares, que pressionaram a Rede Globo para tirá-la. Solano foi contra. Mas eles forçaram a barra, e o júri saiu todo. Não teve nenhuma relação com "Cabeça'", diz.
Atual coordenador no Rio de Janeiro da seleção de músicas do Festival de Música Brasileira da Globo, Albuquerque diz que "Cabeça" agradou, mas, para a platéia do Maracanãzinho, onde houve o festival, "não foi grande coisa".
Ribeiro não teme que a história se repita no festival de 2000. Responsável pela seleção das 23.834 músicas inscritas, ele diz que os tempos são outros. "Não há mais nenhum tipo de censura."
Outro personagem central da história, o compositor Walter Franco, não refuta a versão de Ribeiro. "Embora minha proposta estética tenha causado polêmica, não acho essa versão dos militares absurda. A coisa jamais seria posta abertamente. Não houve censura estética ou ideológica contra mim. Até participei depois de outros festivais da Globo", disse. "Por sua postura política, a Nara teve a carreira pautada por um enfrentamento com o governo militar", diz Franco, dando impulso à versão de Ribeiro.



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