São Paulo, domingo, 27 de maio de 2007

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Quem agüenta ver "Lost" até o fim, em 2010?

Especialistas explicam por que acham que a série, um dos maiores fenômenos da TV, vai segurar (ou não) a audiência

Boninho ("BBB') e Fernando Bonassi ("Carandiru') botam fé no sucesso; para autores como Marçal Aquino e Di Moretti, vai fracassar

SYLVIA COLOMBO
LAURA MATTOS

DA REPORTAGEM LOCAL

Até quando vai dar para agüentar o autoritarismo do doutor Jack, as ironias espertinhas do malandro Sawyer, as dissimulações da misteriosa Kate e as armações do vilão (vilão?) Ben? Mais grave, como os roteiristas de "Lost" vão conseguir amarrar todas os mistérios que inventaram para construir este que é um dos maiores fenômenos da televisão hoje?
Pois não é tão cedo que os lostmaníacos vão poder dormir em paz. A rede norte-americana ABC anunciou que o seriado terá ainda mais 48 episódios, distribuídos por três temporadas, e que só terminará mesmo em... 2010. Será que dá para agüentar até lá?
Muita gente já desencanou. Esperar mais três anos para saber por que o vôo 815 da Oceanic caiu na ilha misteriosa, ex-sede de um projeto científico hoje tomada por uma espécie de seita, parece tempo demais.
Por outro lado, é uma tentação e tanto manter vivas as esperanças do charmoso grupo de sobreviventes que conquistou audiência cativa no mundo.
Estariam os roteiristas de "Lost" ousando muito ao buscar uma fórmula de sucesso de tão longo prazo? Ou seriam eles os desbravadores de uma nova forma de construir narrativas?
"Querer esticar uma idéia original de sucesso é condená-la ao fiasco. A tendência natural é que ela se dilua. Logo eles terão de inventar "barrigas" [formas de esticar a história], o fôlego vai se perdendo. E é aí que começam as apelações", diz Marçal Aquino, de "O Invasor".
Mas será que não há uma arte nascendo justamente nessa tarefa de inventar "barrigas" bem argumentadas? Para Fernando Bonassi ("Carandiru"), "Lost" é revolucionária. "A série traz uma libertação para os roteiristas. Qualquer entidade mística, personagem esquisito, trama mágica, passa a valer desde que tenha consistência dramatúrgica", diz o autor, que vê um aspecto "pedagógico" na série. "Ela pode nos ensinar uma nova forma de contar histórias."
Há quem veja riscos nessa tal "revolução". "Pode ser bom para o mercado que os roteiristas tenham mais liberdade e sejam mais valorizados. Mas é preciso não esquecer que uma obra tem de ser algo acabado, com começo, meio e fim", diz o roteirista Di Moretti ("Latidude Zero"). Para ele, o desgaste de "Lost" é fato consumado. "Já desisti de assistir; a idéia original vai se descaracterizar, e a tendência é que os personagens passem a ser pouco críveis."
Aquino acha que a liberdade dos roteiristas tem um limite, o da audiência. ""Lost" é o coroamento de um processo que já se vê na TV em que o público determina o destino da trama e o autor anda a reboque."

Estratégias
O diretor-geral do "Big Brother Brasil", Boninho, acha que "Lost" "segura" até 2010, mas não acredita que vá criar tendências. "Trata-se de um formato único, desenvolvido durante a sua exibição. Dificilmente veremos outro seriado tão cheio de supostos rumos e mudanças radicais, sem um determinado fim. É uma grande brincadeira entre autores e telespectadores que deu certo."
Para Cao Hamburger, diretor da série "Filhos do Carnaval", "Lost" não é "tão inovadora". "A narrativa guarda semelhança com alguns jogos de videogame ou talvez RPG. É mais um truque ilusionista bem aplicado, e às vezes me parece uma grande farsa, no bom sentido."
Para o novelista da Record Marcílio Moraes ("Vidas Opostas"), o que está segurando o público não é a solução, mas o problema. "Arrisco dizer que, enquanto eles conseguirem propor novos mistérios, a narrativa se sustenta."
Para Moraes, "Lost" joga com o público de forma semelhante às novelas. "Você trabalha com mistérios. Soluciona alguns enquanto propõe outros. O segredo do sucesso, numa narrativa assim, é esconder mais do que mostrar. A solução do mistério pouco importa."
O crítico de cinema da Folha Cássio Starling Carlos, autor de "Em Tempo Real", sobre séries americanas, acredita que seja grande o risco de os telespectadores se cansarem até 2010. "Uma série de enigma, como "Lost", tende a ter longevidade menor do que a de histórias focadas em personagens, que pode ser mais desenvolvido em tramas e subtramas", diz.
Já para a escritora Fernanda Young, tudo não passa de oportunismo de mercado. "É claro que dá para enganar o público até 2010. Dá para enganar o tempo que se quiser. A alternativa de uma solução mágica faz com que tudo seja possível. Essa seqüência de invenções para alimentar mistérios não passa de uma grande bobajada."


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