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ERUDITO
Herzog reforça estatismo de "Tannhäuser"
IRINEU FRANCO PERPÉTUO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
Já está virando rotina. Mais
uma vez, o Teatro Municipal
do Rio de Janeiro fez seu co-irmão
de São Paulo comer poeira.
Em 96, a casa paulistana teve a
oportunidade histórica de sediar
a estréia mundial da onírica concepção de Werner Herzog para a
ópera "Tannhäuser", de Richard
Wagner, mas, como de hábito,
deixou a chance escapar por entre
os dedos.
Resultado: com grande sucesso,
a montagem teve sua première
em Sevilha, em 97, chegando agora ao Brasil, mas do outro lado da
Dutra. O paulistano que quiser
lhe assistir que pegue o ônibus ou
o avião.
Estatismo
"Tannhäuser" é uma ópera na
qual, a rigor, não acontece muita
coisa, e a concepção de Werner
Herzog reforça esse senso de estatismo. Praticamente não há cenário; Vênus, encarnação do amor
carnal, veste o mais vivo dos vermelhos, enquanto Elisabeth e os
menestréis, representando o
amor idealizado, trajam o mais
imaculado dos brancos.
No fundo, 28 ventiladores, invisíveis e sem som (para não atrapalhar a música), produzem um
vento constante, a fazer farfalhar
o tempo todo a seda ligeiríssima
dos despojados figurinos. O
"Tannhäuser" de Herzog é uma
ópera da imaterialidade.
A montagem foi lançada em
DVD, e não deveria ser necessário
dizer que funciona muito melhor
ao vivo. O vídeo não capta toda a
poesia e nuanças de luz de um espetáculo que, no teatro, chega a
emocionar.
Emoção reforçada pela elevada
qualidade do fazer musical. Pela
escolha dos tempos e cortes, o
maestro suíço Karl Martin revelou-se influenciado pelo registro
da versão de Dresden da ópera
feita pelo regente Franz Kowintschny para a EMI, nos anos
60.
Dono de perfeita compreensão
do drama e senso de teatro, e com
um gestual sempre claro e fácil de
ser visto (e entendido) pelos cantores, Martin não apenas foi um
mestre na construção de clímaxes
como ainda atuou como o mais
eficiente dos bombeiros, impedindo com sucesso que os pequenos "incêndios" musicais causados por uma Orquestra Sinfônica
do Teatro Municipal evidentemente limitada e pouco acostumada à escrita wagneriana atrapalhassem a récita do último domingo à noite.
Elenco
Em um elenco bem equilibrado
e de alto nível, o destaque foi
Cheryl Studer como Elisabeth, o
papel que a projetou internacionalmente no Festival de Bayreuth,
em 1985.
Muito se falou sobre uma suposta decadência de Studer nos
últimos anos, mas o que a soprano norte-americana mostrou foi
uma voz cálida e cheia, de belo
timbre e grande facilidade de projeção e emissão.
Já o tenor Heikki Siukola mostrou ser um daqueles gigantes
nórdicos requeridos para a verdadeira maratona vocal que é o papel-título da ópera.
A afinação e o tempo podem
não ter sido lá muito firmes no
primeiro ato, mas se consolidaram nos dois subsequentes, revelando uma voz inteira e capaz de
sustentar suas linhas melódicas, a
serviço de uma concepção do personagem à qual não faltou garra
nem personalidade.
Vozes brasileiras
Mas a melhor notícia de todas
talvez tenha sido que, desde que
bem escolhidas, e nos papéis certos, há vozes brasileiras, sim, aptas a cantar Wagner.
Foram os casos do barítono Lício Bruno (Wolfram) e de Celine
Imbert (Vênus).
Esta última, que já foi uma das
sopranos mais aclamadas do Brasil, está tomando uma decisão
acertadíssima ao mudar de rumo
e se aprofundar cada vez mais no
registro de mezzo-soprano.
A tessitura vocal do papel de
Vênus caiu-lhe muito bem, sendo
complementada por uma atuação
cênica, como de hábito, apaixonada.
O jornalista Irineu Franco Perpetuo
viajou ao Rio de Janeiro a convite do
Teatro Municipal
Tannhäuser
Autor: Richard Wagner
Direção: Werner Herzog
Regência: Karl Martin
Onde: Teatro Municipal do Rio de
Janeiro (pça. Floriano, s/nš, tel. 0/xx/21/
262-3935)
Quando: hoje, 30 de junho e 3 de julho,
às 20h
Quanto: de R$ 25 a R$ 80
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