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São Paulo, sexta-feira, 27 de junho de 2003

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MÚSICA

Show do grupo no Royal Festival Hall revela novo comportamento inglês

Public Enemy coloca em questão tradição britânica

MARK STEEL
DO "INDEPENDENT"

Fui ao mais estranho e perturbador show do ano, do magnificamente militante e explosivo grupo de hip hop Public Enemy. São rappers que causaram indignação há 15 anos e que foram proibidos em metade das cidades dos EUA pois conclamavam a juventude do mundo a "lutar contra o poder". Mas a coisa mais estranha sobre o show era o seu local, o Royal Festival Hall, em Londres.
Era o verdadeiro Royal Festival Hall, aquele mesmo onde eu, aos dez anos, vi a orquestra da BBC tocando "Pedro e o Lobo". Na porta, e se oferecendo para me acompanhar ao meu lugar, estava uma senhora de uns 80 anos. A essa altura, me sentia parte de um sonho e imaginei se ela diria algo como "enfim você chegou, meu caro, K32. Espero que toquem aquela sobre lutar contra o poder daquela porcaria dos EUA. É uma noite ótima para essa".
Ao final de uma apresentação com sirenes uivando e braços voando em todas as direções, em que o Public Enemy transpirou ameaça, nós caminhamos para a saída e passamos por aquela senhora, e ela sorriu uma comissária de bordo. A estranheza da situação tem algo a dizer sobre o moderno Reino Unido. É semelhante ao que percebi quando servi em um júri, e saímos do tribunal para considerar nosso veredicto em um caso sobre tóxicos.
Um dos jurados mais velhos apanhou a prova que estava sobre a mesa e disse "acho que poderíamos dar um "pega" nisso antes de começarmos". Logo ficou claro que estávamos familiarizados com a cultura dos tóxicos, e ninguém se horrorizou com a palavra "drogas", como acontecia no passado. O Reino Unido a que os tradicionalistas sonham se apegar está desaparecendo da memória das pessoas, a um ponto que nos permite ouvir rap em alto volume no Royal Festival Hall. Não é porque as pessoas perderam a capacidade de se chocar, mas porque muito do que parecia certo 15 anos atrás agora está em questão, especialmente o direito dos poderosos de continuarem no poder.


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