São Paulo, Segunda-feira, 27 de Setembro de 1999
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VÍDEO LANÇAMENTOS

O amor constrói... filmes

"SHAKESPEARE APAIXONADO"
BERNARDO CARVALHO
Colunista da Folha

Não espanta uma produção bonitinha mas convencional como "Shakespeare Apaixonado" ter sido a grande estrela do último Oscar, levando, entre outros, os prêmios de melhor filme e atriz.
Não é de espantar que esse filme colegial tenha conquistado a simpatia do público cativo de Hollywood. É que, a exemplo dos enredos das comédias do bardo inglês, aqui também há travestimento e impostura. Tenta-se passar uma coisa por outra.
O filme pretende contar, sob o encanto juvenil, os bastidores da criação de "Romeu e Julieta" em 1593, em Londres, no auge do teatro elisabetano, com gags que reinterpretam a história como uma comédia romântica.
A simpática desmistificação do autor em "crise de inspiração" e da criação literária, como resultado muito mais de acasos do que de um talento divino, acaba servindo, porém, a uma outra mistificação: do cinema americano.
"Shakespeare Apaixonado" não é, como pode parecer, uma celebração do teatro e do gênio do bardo inglês, mas uma alegoria (igualmente celebrante) da glória de Hollywood, com alusões cômicas e diretas (jamais ofensivas) ao modo de produção desse cinema.
A certa altura do filme, a rainha promove uma aposta com a moça apaixonada por Shakespeare e pelo teatro: não é possível uma peça representar realmente o amor. É a moça quem ganha a aposta, depois de uma platéia em lágrimas dar o seu veredicto, ovacionando os atores da primeira apresentação de "Romeu e Julieta" como se fossem -na "vida real"- os verdadeiros personagens da tragédia a que acabaram de assistir.
Ao mostrar esse público crente diante da peça, o filme faz um jogo de espelhos: representa não só o público de hoje crente diante das telas, mas faz um retrato glorioso de si mesmo, desse cinema "tão verdadeiro" que até parece realidade. E a nós, reconhecidos na tela, só resta ficarmos emocionados com a nossa própria tolice.


Avaliação:   

Filme: Shakespeare Apaixonado
Diretor: John Madden
Produção: EUA/Ing., 1998, 122 min.
Com: Gwyneth Paltrow, Joseph Fiennes, Geoffrey Rush, Ben Affleck, Judi Dench
Gênero: romance




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