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MOACYR SCLIAR
Feira é uma festa antiga e necessária para a literatura
SÃO muito antigas, as feiras: existem, pelo
menos, desde a Idade Média. E se duraram
tanto tempo é porque preenchem uma dupla
necessidade: de um lado, oferecem coisas de
que as pessoas precisam, a preços muitas vezes
convenientes; de outro lado, dão oportunidade
a que esse comércio se realize em clima informal, de festa mesmo. Feira é festa. E feira do livro é festa do livro. Mas, alguém perguntará, o
livro precisa de festa? Precisa, sim. Porque, sobretudo para os jovens, o livro é um objeto intimidante, como se pode constatar observando um adolescente numa livraria. Ele se move
com certo receio, como se estivesse num ambiente solene. E fica cheio de dedos ao falar
com o vendedor, com medo de dizer uma bobagem.
Essa complicada relação com o objeto livro
tem uma história. Durante muito tempo, a palavra escrita foi símbolo de poder, de um poder
concentrado nas mãos de poucos. Hoje o livro
é algo comum, mas essa aura que veio do passado persiste, ao menos em países como o nosso. Com seu clima de informalidade, a feira do
livro ajuda a dissipar esse temor. Mais: cria um
clima de familiaridade com a cultura do texto.
A feira é, por exemplo, uma oportunidade de
encontrar escritores: nas sessões de autógrafos, nas palestras, até em encontros casuais. Isto contribui para desmistificar essa misteriosa,
augusta entidade chamada Escritor (assim
mesmo, com E maiúsculo). Entidade que aliás
é produto de muitas décadas de equívoco na
introdução do jovem à literatura.
Para a escola do passado, escritor bom era escritor morto, de preferência morto há séculos.
Os alunos nunca pensavam no autor como
uma pessoa normal, uma pessoa que conversa,
que conta coisas de sua vida e de seu trabalho.
Esse distanciamento obviamente se estendia
ao livro.
Essas coisas estão mudando, porque o país
está mudando. O ensino da literatura tornou-se mais vivo, mais dinâmico. As editoras perderam um certo ranço aristocrático, herança
do passado: profissionalizaram-se, estão
aprendendo a conquistar leitores, sobretudo
os jovens leitores. O mesmo aconteceu com as
livrarias.
As feiras do livro, como a de Ribeirão Preto,
são os eventos que sintetizam essa transformação toda. As feiras convidam, as feiras atraem
-as feiras funcionam: basta ver a desenvoltura com que a garotada ali se move. As feiras são
um ambiente de permanente alegria, de festa.
Uma celebração do livro como fonte de cultura
e de emoção.
MOACYR SCLIAR, 64, é colunista da Folha e autor de "O
Exército de Um Homem Só" e "O Carnaval dos Animais",
entre outros
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