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São Paulo, sábado, 27 de setembro de 2003

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Em qual foto há uma árvore?

Tuca Vieira/Folha Imagem
Visitante da exposição da Oca observa a obra "An Oak Tree' ("Um Carvalho'), do artista irlandês



Obra do artista irlandês Michael Craig-Martin, apresentada pela primeira vez em 1974 e tida como o "grau zero de sua carreira", discute a função da arte como uma crença na exposição "A Bigger Splash"


FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Se você vê uma árvore em apenas uma das fotos, está enganado. Ao menos de acordo com o artista irlandês Michael Craig-Martin, 62. A imagem que, aparentemente, exibe um copo com água, retrata na verdade "Um Carvalho". Isso mesmo, observe de novo.
Ainda não viu? "Um Carvalho", no original "An Oak Tree", foi apresentada por Craig-Martin pela primeira vez em Londres, em 1974, e se encontra agora na mostra "A Bigger Splash", na Oca, no parque Ibirapuera.
Na exposição, "Um Carvalho" é acompanhado de um texto (leia trecho ao lado), que explica por que uma árvore deve ser vista em vez do copo. "Fiz a obra no início dos anos 70, quando havia um debate muito intenso sobre qual era a natureza da arte. Refleti muito sobre qual era a essência da questão e cheguei à conclusão de que ela tinha a ver com a idéia de crença, mais do que qualquer outra coisa", diz o artista britânico.
Tal procedimento é próximo à própria idéia duchampiana de que o contexto cria a obra de arte, mas Craig-Martin deu a ela um sentido mais poético ao radicalizar a experiência da percepção, fazendo com que o observador não só veja ali uma obra de arte, mas também a árvore. "Estou interessado no modo como certas operações ativam a participação do público e, para mim, a melhor forma de conseguir isso é o engajamento. E por engajamento eu digo crença, seja numa pintura do século 16, seja numa obra contemporânea", afirma.
Entretanto, essa idéia de crença não fica apenas com o observador, segundo Craig-Martin. "Há duas formas de crença: a do observador e, a mais importante, do próprio artista nele mesmo e no que ele está fazendo."
"Um Carvalho" é considerada pelo artista o "grau zero" de sua carreira. "Cheguei, com essa obra, a uma desconstrução absoluta na arte. Desde então, venho reconstruindo outras formas de representação, como em "Lendo com o Globo" [de 1980], que também está aqui na Oca", conta.
Depois de apresentada em 74, "Um Carvalho" foi vista na Bienal de Paris, em 1975, e, desde então, circulou o mundo "centenas de vezes". A obra da Tate, vista em São Paulo, não é original. "A original pertence à National Gallery da Austrália. Essa é uma cópia do artista. Mas gosto da idéia de um só original, sem edição", conta.
No entanto, tornou-se uma prática de amantes da arte reproduzir a obra, por sua própria iniciativa. Em São Paulo, a galerista Luisa Strina tem uma em sua casa.
"É uma das obras mais representativas dos anos 70", disse à Folha, em Londres, uma das curadoras da mostra, Joanne Bernstein. "Ele foi um dos principais professores da Goldsmith College, influenciando gerações de artistas ingleses", disse Bernstein.
No prestigiado Goldsmith, Craig-Martin ensinou, de 1974 a 1998, vários artistas que também se encontram na Oca, como Julian Opie e Sarah Lucas. Aliás, as críticas que faz à mostra são ligadas a essa geração. "Creio que a arte britânica nos 90 surgiu com uma força que não se vê aqui. Damien Hirst, por exemplo, participa com uma obra que não é representativa de seu trabalho, enquanto outros artistas importantes, como o fotógrafo Wolfgang Tillmans, sequer estão na mostra."
Quando a Folha convidou Craig-Martin a ser fotografado ao lado de uma árvore no parque Ibirapuera, o artista se entusiasmou com a sugestão. "Vários amigos já sugeriram que minha última obra seja transformar uma árvore em um copo com água", brincou. Mas a árvore continua da mesma forma no parque.

ART REVOLUTION: A BIGGER SPLASH - ARTE BRITÂNICA DA TATE DE 1963 - A 2003. Exposição de 56 artistas a partir do acervo da Tate Gallery. Curadoria: Catherine Kinley e Joanne Bernstein. Onde: Pavilhão da Oca (parque Ibirapuera, portão 3, SP). Quando: de ter. a sex., das 9h às 21h; sáb. e dom., das 10h às 21h. Até 26/10. Quanto: R$ 6. Patrocinadores: Accenture, British Council, HSBC Bank, Sodexho.


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