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"LABORATÓRIO DE PERFORMANCES"
São Paulo abre espaço para utopia bem no centro da cidade
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
Você já foi até a Dom José de
Barros, esquina com a 24 de
Maio? Lá, na fachada de um prédio em reformas, se ergue uma espécie de muro das lamentações
invertido. Desempregados, office-boys, aposentados garimpam
ofertas de emprego em cartazes
escritos à mão. Lá funcionava
uma grande loja de departamentos e, na calçada da frente, ainda
se vê a laje de pedra sobre a qual,
em 1983, Nelson Triunfo introduziu a dança de rua no Brasil.
Quinta, perto das 11h, um ambulante derrubou parte do muro
de papel: um "engravatado" lhe
recusara um emprego sonhado.
Não notou que, entre os cartazes,
havia uma mensagem cifrada: "El
deseo/ Resbala. Resbala/ y corta./
Tratar com urgência aqui". Pena.
Poderia ter transformado sua ira
em dança se percebesse ser esse
cartaz uma chave para a porta logo atrás dele: "Danças na 24. Entrada franca".
Essa porta permanecerá aberta
das 11h às 17h. Quem se aventurar
por ela encontrará na loja em descalabro convertido em maravilha
por Daniela Thomas uma ampla
pista de dança em torno de uma
transparente escada rolante, sob a
qual DJs alternam todo tipo de
música, para que se possa dançar.
Companhias de dança encorajam
a população a se soltar.
Na quinta, a Companhia Quatro, de Cristiane Paoli Quito, fazia
sala para a utopia. Cláudio Faria,
trompetista-arquiteto, solava. Em
um instante, Érica Moura se esgueira no chão para seduzir uma
menina que se encolhia tímida.
Perto dali, Tica Lemos ouve a longa história de um aposentado.
Para quem não dança, mas se
deixa ficar, há livros. Dentro de
uma câmara de plástico, uma
atriz lê e deslê Deleuze. A curadoria do delírio é de Ricardo Fernandes, aquele que criou o "não-lugar" no Festival de Rio Preto.
Logo no primeiro dia o espaço
já ostentava um bilhete que invertia a função perversa dos cartazes
lá de fora: "Dá só um motivo para
tanta alegria". Ora, cidadão, o
motivo se cria dançando. Pergunte a esse dançarino de imensa cabeleira que dança diante da antiga
vitrine da loja. Na rua, o aplaudem, enquanto ele se lembra
emocionado do duro começo de
seu percurso na laje em frente.
Laboratório de Performances
Com: bailarinos e Djs revezam-se
Onde: Sesc (rua 24 de Maio, São Paulo,
0800-118220)
Quando: de seg a sex., das 11h às 17h;
sáb., das 10h às 13h; até 1º/11
Quanto: entrada franca
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