São Paulo, sábado, 27 de outubro de 2007

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Livro desmistifica imagem inocente de Clara Nunes

Fartamente ilustrado, "Guerreira da Utopia", do jornalista Vagner Rodrigues, mostra personalidade "sagaz e observadora"

Quase 25 anos depois, biografia reexamina polêmica morte da cantora, durante cirurgia de varizes, que gerou "circo" midiático

MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DA REPORTAGEM LOCAL

Foi de vestido branco, sorrindo, gingando com sua cabeleira e cantando sambas, que a mineira Clara Nunes se eternizou na música brasileira.
Mas essa personagem, talhada sob medida por sua gravadora, é apenas a mais bem-sucedida das que Clara Francisca Gonçalves se dispôs a viver, como mostra o jornalista Vagner Fernandes na biografia "Clara Nunes - Guerreira da Utopia".
"A Clara tal qual a conhecemos, a imagem que ficou no inconsciente coletivo, foi pré-concebida. Até gravar o disco que marcaria sua virada [para o samba], em 1971, ela era uma cantora de bolero, de músicas de gosto duvidoso", diz Fernandes à Folha, por telefone.
O livro, lançado agora, quando se aproximam os 25 anos da morte da artista (em 2/4/83, aos 40 anos), também desmistifica a imagem mais comum que se tem da cantora pré-sucesso. "A visão da Clara como uma menina inocente, interiorana, com roupa de chita e uma sacola na mão, não condiz com as narrativas que escutei de pessoas que conviveram com ela. Até pelas circunstâncias em que viveu, ela foi sagaz e observadora desde cedo."
Os diversos percalços de Clara são narrados em detalhes -ela perdeu o pai aos dois anos, a mãe aos seis e teve de se mudar para Belo Horizonte aos 15, após seu irmão matar um rapaz para defender sua honra.
Fartamente ilustrada, a obra acompanha toda a trajetória musical da cantora, desde os tempos de caloura do rádio até o estouro na década de 70, com uma série de discos cheios de sucessos como "Ê Baiana", "Conto de Areia" e "Na Linha do Mar".

Morte polêmica
"Guerreira da Utopia" também reexamina a polêmica morte da cantora, durante uma cirurgia de varizes. Fernandes entrevistou Antonio Vieira de Mello, cirurgião-chefe da equipe que operou Clara, e este solicitou o desarquivamento da sindicância aberta pelo Conselho Regional de Medicina do Rio na época.
"Ele queria mostrar sua inocência. Falou: "Está tudo aqui, eu não matei a Clara"." Durante os 28 dias em que agonizou, a cantora foi vítima justamente do que mais queria evitar, o "circo" midiático de especulações que ela já tinha visto na morte de Elis Regina, no ano anterior. As versões para sua internação "eram as mais esdrúxulas possíveis", diz Fernandes. "Inseminação artificial, aborto, tentativa de suicídio, surra de seu marido, Paulo César Pinheiro, foram várias as hipóteses aventadas."
Do mesmo modo, as causas de sua morte também causaram suspeitas por longo tempo, mas Fernandes é categórico em sua conclusão. "Ela teve uma reação alérgica a um componente do anestésico, algo imprevisível. Foi uma infelicidade."


CLARA NUNES - GUERREIRA DA UTOPIA
Autor: Vagner Fernandes
Editora: Ediouro
Quanto: R$ 50, em média (320 págs.)



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