São Paulo, sábado, 27 de outubro de 2007

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crítica

Charlone vê país com humor e melancolia

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

A cidadezinha uruguaia de Melo, na fronteira com o Brasil, prepara-se para a visita do papa João Paulo 2º, em 1988. São esperados 50 mil visitantes. Cada morador do lugarejo vai tentar tirar proveito do evento como pode: um fazendo algodão-doce, outro batendo fotos, outro vendendo santinhos.
O sacoleiro Beto (César Trancoso), que atravessa todo dia a fronteira de bicicleta trazendo clandestinamente produtos brasileiros, tem uma idéia diferente: construir um banheiro que sirva, mediante uma módica tarifa, à multidão de peregrinos.
Em torno desse "plot" original gira o longa de estréia de dois veteranos, o uruguaio Enrique Fernández e o brasileiro de origem uruguaia César Charlone. O primeiro é o premiado roteirista de "Otário"; o segundo, o consagrado diretor de fotografia de "Cidade de Deus", entre outros. Ancorados nessa experiência acumulada, Charlone e Fernández criaram um pequeno prodígio, um filme sólido, divertido, comovente, crítico e belo como poucos.
As peripécias de Beto, sua família e seus vizinhos dão a ver um Uruguai profundo, que tem muitos pontos em comum com o Brasil e com a América Latina em geral, mas que traz um sentimento mais profundo de melancolia e derrota.
Da atividade cotidiana do protagonista -uma contravenção "benigna", que conta com as vistas grossas ou a corrupção das autoridades- às esperanças de redenção suscitadas pela visita papal, tudo nos é muito convincente e familiar.
Em cada plano, seja na amplidão dos campos por onde Beto e seus amigos pedalam, seja nas ruas de terra do vilarejo ou nos cômodos apertados e polivalentes de um casebre, lateja uma verdade humana profunda, modesta, discreta. É na atenção ao pequeno, ao desprezado e esquecido que Charlone e Fernández falam do grande mundo -e fazem grande cinema.


O BANHEIRO DO PAPA
Direção: César Charlone e Enrique Fernández
Produção: Brasil, Uruguai, França, 2007
Com: César Trancoso, Virgínia Mendez
Quando: hoje, às 14h, no iG Cine
Avaliação: ótimo



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