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crítica
Charlone vê país com humor e melancolia
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
A cidadezinha uruguaia de Melo, na
fronteira com o Brasil, prepara-se para a visita
do papa João Paulo 2º, em
1988. São esperados 50 mil
visitantes. Cada morador do
lugarejo vai tentar tirar proveito do evento como pode:
um fazendo algodão-doce,
outro batendo fotos, outro
vendendo santinhos.
O sacoleiro Beto (César
Trancoso), que atravessa todo dia a fronteira de bicicleta
trazendo clandestinamente
produtos brasileiros, tem
uma idéia diferente: construir um banheiro que sirva,
mediante uma módica tarifa,
à multidão de peregrinos.
Em torno desse "plot" original gira o longa de estréia
de dois veteranos, o uruguaio
Enrique Fernández e o brasileiro de origem uruguaia César Charlone. O primeiro é o
premiado roteirista de "Otário"; o segundo, o consagrado
diretor de fotografia de "Cidade de Deus", entre outros.
Ancorados nessa experiência acumulada, Charlone
e Fernández criaram um pequeno prodígio, um filme sólido, divertido, comovente,
crítico e belo como poucos.
As peripécias de Beto, sua
família e seus vizinhos dão a
ver um Uruguai profundo,
que tem muitos pontos em
comum com o Brasil e com a
América Latina em geral,
mas que traz um sentimento
mais profundo de melancolia
e derrota.
Da atividade cotidiana do
protagonista -uma contravenção "benigna", que conta
com as vistas grossas ou a
corrupção das autoridades-
às esperanças de redenção
suscitadas pela visita papal,
tudo nos é muito convincente e familiar.
Em cada plano, seja na
amplidão dos campos por
onde Beto e seus amigos pedalam, seja nas ruas de terra
do vilarejo ou nos cômodos
apertados e polivalentes de
um casebre, lateja uma verdade humana profunda, modesta, discreta.
É na atenção ao pequeno,
ao desprezado e esquecido
que Charlone e Fernández
falam do grande mundo -e
fazem grande cinema.
O BANHEIRO DO PAPA
Direção: César Charlone e Enrique
Fernández
Produção: Brasil, Uruguai, França,
2007
Com: César Trancoso, Virgínia
Mendez
Quando: hoje, às 14h, no iG Cine
Avaliação: ótimo
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