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Coral de prisioneiras
é tema de 'Canto'
ADRIANE GRAU
enviada especial a Menlo Park
Assim como a personagem de
Glenn Close em "Um Canto de Esperança", que passa hoje na Mostra, Helen Colijn, 75, afirma que
teve a alma acariciada pelas vozes
do coral de mulheres formado
num campo de prisioneiras em Sumatra durante a Segunda Guerra.
Capturada pelos japoneses aos 21
anos, quando o navio em que escapava da Indonésia naufragou, ela
acabou passando três anos no
campo junto com as duas irmãs,
que na época tinham 16 e 20 anos.
"Quando fui libertada em agosto de 1945, pesava 45 kg e estava
amarela por causa da malária",
afirma ela, que tem 1,77 m de altura. "Nem lembro como a partitura
foi parar entre nossos pertences."
Atualmente morando em Menlo
Park, ela doou à vizinha Universidade de Stanford em 1981 as notas
da "Sinfonia do Novo Mundo",
de Dvorak, que haviam sido transcritas a mão por Margaret
Dryburgh e Norah Chambers. Juntas elas lideravam as vozes do coral
formado por 30 mulheres em 1943,
após três anos de cárcere.
"Mas o coral só durou um ano,
pois as mulheres iam morrendo
aos poucos", diz Colijn, que nunca cantou com o grupo. "Desde
criança haviam me convencido
que eu não tinha voz para cantar."
Ela escreveu sua história no livro
"Song of Survival: Women Interned" em 1995, publicado na Holanda e nos EUA. Segundo Colijn,
ela e as irmãs sobreviveram graças
ao treinamento físico imposto pelo
pai. "Vivíamos em luxo, pois ele
gerenciava uma empresa extratora
de petróleo."
As partituras foram guardadas
por sua irmã Antoinette, que fazia
parte do coral, até serem doadas a
Stanford. "Ela vive em Washington e percebeu que o papel estava
começando a se desfazer", diz ela.
"Não queríamos que a memória
se perdesse."
Segundo ela, "Um Canto de Esperança" não é um retrato muito
fiel do que se passou com os 100
mil prisioneiros mantidos em Sumatra durante a guerra. "É uma
versão hollywoodiana da história e
exagera os fatos", diz ela. "Mas o
importante é a música, que são as
vozes reais."
Parte de suas críticas vão para os
conflitos étnicos que colocam britânicas e holandesas em facções
opostas. "Holandesas e britânicas
se tornaram amigas, trocamos cartas durante anos", diz ela. "Haviam diferenças culturais, como as
britânicas colocando a roupa embaixo do colchão à noite para não
vestir linho amassado e insistindo
para as crianças usarem os talheres
corretamente."
Para Colijn, as diferenças acabavam aí. "Exceto pelas duas mulheres que compuseram a música,
não havia nenhuma liderança, éramos todas iguais", lembra ela.
"Algumas coisas não dava para
mostrar, como por exemplo como
era grande nossa fome e quanto
nos sentíamos isoladas", diz ela.
"Grande parte da brutalidade
não era física, não era visual; mas
num filme você precisa mostrar
violência para as pessoas acreditarem que estava acontecendo."
Onde: Masp 1 - Grande Auditório, hoje, às
18h40
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