São Paulo, quinta-feira, 27 de dezembro de 2001

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A Bienal do terror

Vanessa Beecroft/Reprodução do catálogo "VB 08-36 - Vanessa Beecroft Performances"
Cena de performance da artista italiana Vanessa Beecroft, 32, que confirmou presença na 25ª edição da Bienal de São Paulo, sob curadoria do alemão Alfons Hug



Referências aos atentados ao World Trade Center devem comparecer à 25ª edição do evento, que começa em março


FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

A 25ª Bienal de São Paulo não ficará imune à destruição das torres gêmeas do World Trade Center. "Ela será o primeiro termômetro internacional das artes plásticas após os atentados terroristas de 11 de setembro", diz o curador-geral da Bienal, Alfons Hug.
O terror alterou até uma de suas propostas originais, de criar um ambiente de música eletrônica, o Techno Club, já que o tema central é a metrópole. "Não há razões para criar um ambiente festivo. Artistas internacionais que vieram conhecer o pavilhão já adiantaram que farão referências à nova situação mundial", afirma.
O curador da Bienal é um alemão. Pela primeira vez um estrangeiro está à frente do evento mais importante das artes plásticas no Brasil. Chegou após uma das mais violentas crises da instituição e enfrentou resistências.
Menos de três meses antes da inauguração (que acontecerá em 23 de março), Hug já comemora a presença de artistas contemporâneos renomados. Entre eles, a italiana Vanessa Beecroft, o alemão Andreas Gursky e o norte-americano Jeff Koons, que terá uma sala especial. Outro dos orgulhos é ter conseguido um artista, o brasileiro Arthur Omar, que deve ir ao Afeganistão em busca de restos dos Budas destruídos pelo Taleban, o que promete polêmica.
Há um ano vivendo em São Paulo, Hug contou à Folha sobre as perspectivas da Bienal e sua adaptação no país. Leia abaixo.

Folha - O 11 de setembro vai influenciar a 25ª Bienal?
Alfons Hug -
Sim, sem dúvida. Na minha cabeça e na dos artistas mudaram certas coisas. O clima de festa que antes era possível desapareceu. Não vejo mais sentido em organizar o Techno Club, trazendo o bar Hungry Duck, de Moscou, que tem um forte caráter sexual, explícito até. Seria frívolo reproduzi-lo aqui, por exemplo.

Folha - O que mais?
Hug -
Essa Bienal será mais séria, menos lúdica do que prevíamos. Vários projetos de artistas foram alterados e terão uma carga mais dramática, certamente. Só não posso adiantá-los agora.

Folha - O sr. chegou ao país após uma grande crise da Fundação Bienal. Foi difícil adaptar-se?
Hug -
No início houve uma certa polêmica, claro. Mas estou nessa área há mais de 20 anos, em várias culturas distintas, na África, Ásia e América do Sul, pelo Instituto Goethe. Sempre tive de me adaptar a situações difíceis.

Folha - Acha que a imagem da Bienal estava arranhada?
Hug -
Acho que isso é uma coisa de São Paulo, de questões internas. Quanto mais longe se vai, mesmo no Rio, a avaliação é outra, e no exterior ainda mais. Nas viagens percebi uma grande curiosidade em torno da Bienal e muita vontade de participar.

Folha - O sr. não faz parte de um sistema internacional de curadores. Isso dificultou seu papel?
Hug -
Não faço parte de um certo círculo, mas fui curador da Casa das Culturas do Mundo, em Berlim, dedicada à cultura extra-européia. Se isso não é fazer parte de um sistema, não é problema meu, que sou menos eurocêntrico que muitos curadores desse grupo.

Folha - Sua adaptação a uma estrutura brasileira foi difícil?
Hug -
Foi difícil no início, mas me sinto com mais liberdade que num instituto alemão. Admiro o funcionamento da Bienal, ela se mantém com baixo orçamento fixo, e a cada dois anos é necessário um imenso trabalho de captação. Na Europa a situação daqui seria um imenso estresse. Eles precisam aprender com o Brasil.

Folha - O sr. crê que a Bienal ocorrerá conforme o projeto original?
Hug -
Creio que sim. Conseguimos todos os artistas que queríamos e ainda indicamos alguns das representações nacionais, como Stan Douglas, pelo Canadá. O Andreas Gursky, por exemplo, não participa mais de coletivas e estará aqui. É uma conquista.


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