São Paulo, segunda-feira, 27 de dezembro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MÚSICA

Cantora e compositora que começou com o grupo roqueiro carioca Sex Beatles lança segundo álbum solo

Cris Braun clama por paz e serenidade em seu "Atemporal"

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

Tranqüilidade , calma, serenidade. São os valores de eleição da bissexta cantora e compositora Cris Braun, 42, na chegada do segundo álbum solo de sua vida, "Atemporal" (antes, ela fora do rock'n'roll, construindo ao lado do parceiro Alvin L. a história obscura, porém brilhante do grupo carioca Sex Beatles).
A sonoridade suave de "Atemporal" dialoga e contrasta com a eletrônica leve da experiência individual anterior, "Cuidado com Pessoas como Eu" (98), lançado pelo efêmero selo de Marina Lima na gravadora Universal -o de agora, 100% independente, sai do forno pela jovem gravadora Psicotrônica. Alguma programação eletrônica ainda percorre o novo álbum, assim como os efeitos de paz em vários momentos são produzidos por paredes estranhamente quietas de guitarras.
Faz pensar, pelo tom plácido e quase campestre das canções, no desprezado rock rural dos anos 70, tipo Sá, Rodrix & Guarabyra, como em "Bom-Dia", cantada em duo interiorano com Paula Toller.
A impressão encontra apoio na trajetória pessoal de Cris, gaúcha que cresceu em Maceió (AL) e se fez metropolitana por várias décadas vividas no Rio de Janeiro. Há quatro anos, ela se mudou para "o mato" de Teresópolis, perto demais das capitais, mas "a oito quilômetros da primeira padaria", segundo conta, divertida.
"Estava deprimida, raivosa, brigando com pessoas na rua. Após anos de análise, tive o insight de que precisava sair do contexto urbano, ter uma vida mais comtemplativa mesmo. Foi tiro e queda", conta, fornecendo sem querer razões para a virada também musical em direção à contemplação.
Diz que o CD não expressa anseios utópicos pela calma, mas sim seu novo cotidiano real. "Ouço Bach e Mozart o tempo inteiro. Nos intervalos ouço Nirvana, Reginaldo Rossi", faz figura.
Brinca com esse tipo de noção na provocativa "Drum and Bass Is Past", uma das melodias mais gostosas de "Atemporal". É orgânica, mas Cris promete que a faixa não pretende ser um libelo contra a música eletrônica.
"Vim para um lugar mais tranqüilo para fugir da batida rápida dos corações, do excesso de consumismo, e nessa música traduzi isso como "drum and bass". É só uma sacanagem minha com a vida noturna", ri. "Bacana é o campo aberto, o que eu queria propor é uma maior liberdade de criação, que talvez estivesse faltando graças às fórmulas da indústria", discute, propondo conciliações como as de pop-rock e bucolismo, ou MPB e eletrônica.
Por esse canal de diálogo, "Atemporal" faz espelho invertido com o álbum anterior. Se aquele polvilhava de efeitos eletrônicos os antigos Jair Amorim e Evaldo Gouveia (em "Brigas") e o eterno Chico Buarque ("Bom Conselho"), este coalha de intimidades interioranas o novo Jair Oliveira (na forte "Falso Amor") e o eterno Caetano Veloso (na pré-tropicalista "Nenhuma Dor").
Como já acontecia, Cris Braun vem participar da música popular brasileira de mansinho, sem alardes ou espalhafatos. Em práticas simples como a de fazer música calma com guitarras, segue na utopia de elaborar pequenas e mansas inversões -a que predomina agora envolve e abriga dizer que o Brasil também pode ser lar de tranqüilidades, remanso de desaceleração sem que isso signifique perda de ímpeto.


Atemporal
    
Artista: Cris Braun
Lançamento: Psicotrônica
Quanto: R$ 30, em média



Texto Anterior: Visuais: Retrospectiva destaca a pintura do alemão Martín Kippenberger
Próximo Texto: Televisão: Globo afasta Xuxa durante três meses
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.