São Paulo, quarta-feira, 28 de fevereiro de 2001

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PERSONALIDADE

Em livro escrito por Luiz Carlos Maciel e Maria Luiza Ocampo, atriz revê carreira e assassinato do marido

Biografia tira Dorinha Duval da sombra

AILTON MAGIOLI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Dorinha Duval insinua uma saída da sombra, depois de duas décadas. "Em Busca da Luz - Memórias de Dorinha Duval Narradas a Luiz Carlos Maciel e Maria Luiza Ocampo" promete reacender a polêmica em torno do assassinato do publicitário Paulo Sérgio Garcia, cometido pela atriz paulista, então sua mulher.
Fixada no imaginário do telespectador na faixa dos 30 anos de idade como uma das irmãs Cajazeira da novela "O Bem Amado", a ex-vedete Dorinha matou o marido com três tiros em sua própria casa, no bairro Jardim Botânico, zona sul carioca, na noite de 5 de outubro de 1980.
Responsável pela redução da pena de Dorinha em seu segundo julgamento, a tese de legítima defesa volta a ser invocada pela atriz no livro que, ao longo de 200 páginas, narra uma vida intensa e trágica que teve seu ápice com o crime praticado contra o terceiro marido, 16 anos mais jovem do que ela.
Da vedete eleita três vezes consecutivas uma das "Certinhas do Lalau" pelo jornalista Stanislaw Ponte Preta, hoje pouco ou quase nada resta. Aos 72 anos de idade, aposentada e bem acima das medidas que chamaram atenção do diretor Daniel Filho, seu segundo marido, Dorinha Duval vive sozinha em apartamento próprio no bairro carioca de Botafogo, em constante estado de meditação, entre pinturas e esculturas, de inspiração esotérica, de sua autoria.
Agora, começa a pôr fim à reclusão. A convite da Escola de Samba Mocidade Independente de Padre Miguel, fez sua estréia na passarela do samba carioca no último domingo, desfilando no Sambódromo. "Fiquei surpresa com o convite. Nunca tinha saído em uma escola. Não deixa de ser o meu retorno ao grande palco", diz. Dorinha tomou parte da ala que reverenciava o mundo infantil e prestava homenagem a Monteiro Lobato, o autor de "Sítio do Pica-Pau Amarelo" -em cuja versão televisiva, Dorinha interpretou a falsa bruxa Cuca, seu último papel na TV brasileira. "Carnaval é arte, e o tema da escola era a paz; a paz não discrimina."
Levada a júri em 1983, a atriz foi condenada a 18 anos de prisão. Com o julgamento anulado, apesar dos recursos impetrados pelos advogados da família da vítima, seis anos depois ela teria a pena reduzida para seis anos de cadeia. Cumpridos oito meses de prisão no Rio, Dorinha Duval ganhou direito ao regime semi-aberto, no qual acabou de cumprir a pena.
Dorinha colheu significativo sucesso ainda jovem na carreira artística. Bailarina de grupo em cassinos, aos 23 anos viajava com o sexteto Brasil Moreno para cantar samba em cassinos do Brasil e da Europa. O gosto pela arte nasceu em casa, onde, além de tocar piano o pai gostava de declamar poemas. "Acredito que ele tenha me influenciado porque tinha alma artística", conta ela, que estreou nos palcos ao lado de Cauby Peixoto, estrelando musical de José Vasconcelos e Zeloni no Teatro de Alumínio, em São Paulo.
Vedete consagrada, Dorinha acompanhou de perto os primeiros passos da TV nacional. Tomou parte da cerimônia de inauguração da televisão brasileira, na década de 50, cantando e tocando maraca na orquestra do maestro Robledo. Estrela de companhias de teatro de revista comandadas por Walter Pinto, Juan Daniel, Carlos Lisboa e outros diretores de sucesso nas décadas de 40 e 50, Dorinha também teve breve passagem pelo cinema. Chegou a contracenar com astros do porte de Mazzaropi e Grande Otelo.
Depois de trabalhar nas TVs Tupi, Excelsior e Rio (onde participou de teleteatros e programas como "Time Square" e "Adoro a Dora" -neste último mostrando o dia-a-dia de um casal ao lado de Daniel Filho), na década de 70 estrearia na TV Globo. A convite de Vicente Sesso, fez um pequeno papel em "Meu Primeiro Namorado", protagonizada por Regina Duarte e Cláudio Marzo.
Posteriormente, faria "Irmãos Coragem", de Janete Clair, seguida de seu maior sucesso na TV, "Selva de Pedra", da mesma autora, no papel da matuta Diva. O sucesso se repetiria na primeira novela em cores da televisão brasileira, "O Bem-Amado", de Dias Gomes, em que vivia uma das irmãs Cajazeiras ao lado de Ida Gomes e Dirce Migliaccio. Depois vieram as novelas "O Espigão" e "Maria, Maria", além do humorístico "Azambuja & Cia.", ao lado de Chico Anysio, e do infantil o "Sítio do Pica-Pau Amarelo".
O primeiro casamento de Dorinha Duval foi com o produtor Mário Pamponet Júnior, então diretor da TV Tupi de São Paulo. Divorciada, no final da década de 60 a atriz se casaria com Daniel Filho, que conheceu ainda menino na companhia de teatro do futuro sogro, Juan Daniel, na qual substituiu a então estrela Elvira Pagã. A cerimônia de casamento, ("chiquérrima", diz a atriz), foi em Las Vegas, nos EUA. O fim do casamento a levaria à primeira experiência com o álcool, conta ela no livro. Por essa época, ela conheceria Paulo Sérgio Garcia, então desempregado e para o qual conseguiria uma vaga na agência de publicidade do amigo Carlos Manga, diretor com quem havia trabalhado em vários programas.
Apesar de aposentada, a atriz mantém-se ligada à Globo por contrato profissional até os dias de hoje. O retorno à televisão, no entanto, é descartado pela própria Dorinha. "Sou muito grata à Globo pelo salário e plano de assistência médica, que inclui até a cremação de meu corpo", conta.
A inspiração para a pintura a óleo e a escultura em bronze que cultiva vem dos momentos de meditação em casa. Adepta da leitura esotérica, a atriz tem sempre a seu lado obras como "Conversações Esotéricas", do espanhol Vicente Beltrán Anglada, e "Wagner, Mitólogo y Ocultista", do italiano Mario Roso de Luna.
"Vou vivendo até quando Deus permitir", diz a atriz, cujos principais relacionamentos hoje são a filha Carla Daniel, também atriz -atualmente na novela "O Cravo e a Rosa", onde interpreta Lourdes, uma das solteironas convictas da trama- e o ex-marido Daniel Filho.



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