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Novo livro do sociólogo Michel Maffesoli analisa a transição da era pós-moderna
Laboratório de nomadismo
Ana Carolina Fernandes - 30.ago.00/Folha Imagem
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O sociólogo francês Michel Maffesoli, que teve seu livro lançado recentemente no Brasil, em conferência na sede da ABL, no Rio |
Estudioso francês diz que século 21 será uma era mais cultural do que econômica para a Europa
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EDUARDO ROCHA
DA AGÊNCIA FOLHA
Um laboratório para uma nova
era. Assim o sociólogo francês
Michel Maffesoli vê a condição do
Brasil neste novo milênio. Em sua
obra recém-lançada no Brasil,
"Sobre o Nomadismo - Vagabundagens Pós-Modernas" (Ed. Record), Maffesoli analisa a transição da era pós-moderna e a volta
aos arcaísmos.
O livro retoma a idéia do avanço
da autonomia do indivíduo em
uma sociedade que se fragmenta.
Nele, o autor vislumbra "a criação
de um novo mundo". Para tanto,
destaca "Casa-Grande & Senzala", de Gilberto Freyre, como
exemplo de um "novo mundo"
criado pelos portugueses.
Professor do Centre d'Études
sur l'Actuel et le Quotidien, da
Universidade Sorbonne, Maffesoli se prepara para vir ao Brasil em
setembro, com os pensadores Edgar Morin e Jean Baudrillard, para
participar de um ciclo de palestras
em São Paulo e em Porto Alegre.
Em entrevista à Folha, o autor
analisa ainda o significado dos
atentados terroristas aos EUA e a
construção de uma nova Europa,
a partir do euro.
Folha - Acaba de ser lançado no
Brasil seu último livro, "Sobre o Nomadismo". O sr. poderia fazer uma
apresentação dessa obra?
Michel Maffesoli - O que eu quero mostrar nesse livro é o que eu
chamo de "a volta dos arcaísmos". Isto é, o fato de que não vai
mais haver uma espécie de prisão
à domicílio, seja no sentido ideológico, profissional, sexual. Como
a imagem das sociedades primitivas, vai haver uma circulação, um
comércio, no sentido antropológico do termo, no sentido da troca. A idéia central do nomadismo
é uma nova circulação. Todo o
nomadismo é a inauguração de
um novo mundo, do modo pós-moderno. Estamos exatamente
sobre esses três pontos da identidade pós-moderna: uma ideologia, um sexo, e uma profissão. Várias ideologias, vários sexos, e várias profissões, tudo o que remete
à mestiçagem. Nesse sentido é
que eu acho que o Brasil pode ser
um belo laboratório de nomadismo, assim como a Europa foi um
modelo de modernidade.
Folha - Sobre o 11 de setembro,
quais mudanças ocorreram nas sociedades do mundo após os atentados terroristas aos EUA? De que
maneira as relações entre Ocidente
e Oriente foram alteradas?
Maffesoli - Acho que esse famoso 11 de setembro não pode ser
visto apenas em termos geopolíticos. Ele não foi um simples acontecimento, mas algo que está chegando, um advento. Não só o que
pode suportar uma interpretação
racional, mas uma volta às ilusões, ao imaginário. É um sintoma de uma volta do não-racional.
Um segundo ponto seria o golpeamento de um símbolo fálico
do Ocidente. É interessante ver
como essas torres são um símbolo
fálico por excelência. Em nome
do poder econômico podem ruir
a partir de uma força que vem do
imaginário.
Folha - E em que grau o sr. acha
que o "american way of life" foi
atingido pelos atentados?
Maffesoli - Profundamente. É
uma espécie de ferimento narcisista. Foi um golpe profundo cujos efeitos nós iremos ver mais
tarde. Em termos de repercussão,
no que concerne particularmente
ao "american way of life", é fato
que a vida não é exatamente redutível à economia, o que é particularmente positivo.
Folha - O sr. concorda que houve
um contato maior entre as "tribos"
do Ocidente e Oriente após o 11 de
setembro, e que essa troca de informações vem envolta em uma
carga ideologizada, que beneficia
o dominante, no caso, os EUA?
Maffesoli - O que eu chamo de
"ferida narcisista" é o "Colosso de
Rodes" -é o gigante dos pés de
barro. Acho que todos os grandes
valores ocidentais, como o trabalho, a razão, e a positividade foram atingidos e causam uma
grande repercussão no inconsciente coletivo. Então, o grande
modelo hegemônico da América
foi golpeado. E mesmo a vitória
dos EUA no Afeganistão é uma
"vitória de Pirro". É aparentemente uma batalha entre a força e
o imaginário.
Folha - De que modo a União Européia pode ocupar uma nova posição mundial com a adoção do euro?
Maffesoli - É preciso ver a Europa a partir da idéia imperial. A Europa persiste numa dimensão
econômica, e o mais importante é
que ela seja compreendida do
ponto de vista cultural. Aí sim,
pode-se falar em uma força cultural européia. Entendemos que o
século 21 será uma era mais cultural do que econômica. Estamos
num momento em que a Europa
vai passar do virtual para o real.
SOBRE O NOMADISMO -
VAGABUNDAGENS PÓS-MODERNAS -
De: Michel Maffesoli.
Editora: Record.
208 páginas.
Quanto: R$ 21
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