|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TELEVISÃO
Concorrente de Minas Gerais chega à última pergunta do "Show do Milhão", erra e fica apenas com R$ 300
Professor perde R$ 1 mi em programa
ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL
Era uma pergunta fácil, facílima, e poderia mudar o destino do
professor aposentado Jair Hermínio da Silva, um solteirão mineiro
de 57 anos. Se modificasse o dele,
também transformaria os de outras duas aposentadas, Zezé e Didi, tão solteiras quanto o colega de
magistério que ambas sempre tomaram por "sabichão".
A sorte, entretanto, tem caprichos insondáveis. E, em vez de
trazer a reviravolta que prometera, acabou deixando tudo como
estava na rotina dos três amigos.
A pergunta fácil, facílima: quantas letras compõem o lema da
bandeira nacional? Silvio Santos
lançou-a, risonho, durante o
"Show do Milhão" - e o telespectador do SBT deverá ver a cena
hoje à noite, salvo alterações repentinas (e nem um pouco incomuns) na grade da emissora.
O professor, que chegara à última etapa do programa, ouviu a
indagação em silêncio. Se desistisse de respondê-la, embolsaria os
R$ 500 mil já ganhos nas fases anteriores. Se acertasse, levaria o
alardeado R$ 1 milhão. Se errasse,
sairia dali quase sem nada.
Desde que o "game" estreou,
em novembro de 99, apenas seis
concorrentes flagraram-se na
mesma situação de Jair. Ninguém
arriscou responder a questão final. Todos se contentaram com os
R$ 500 mil.
Ocorre que, para nenhum dos
seis, Silvio fizera uma pergunta
tão simples como a que o professor escutara. Jair se encontrava à
beira do milhão porque, um dia
antes, ultrapassara dúvidas bem
mais espinhosas, sobre astronomia, literatura, biologia, história.
Não iria recuar agora.
Dispunha de 20 segundos para
responder. Caso tivesse êxito, dividiria o prêmio em partes iguais
com Zezé (Maria José de Camargo, 63) e Didi (Ana Romanini, 58).
As duas paulistas -que se tornaram amigas do professor há 19
anos- o incentivaram a participar da competição. O trio define-se como "de classe média baixa".
Cada um contabiliza renda mensal entre R$ 1.800 e R$ 2.000. Zezé
e Didi têm casa própria. Jair, não.
Com o dinheiro, pretendiam,
claro, encostar definitivamente "o
burro na sombra". Planejavam,
ainda, ajudar "uns conhecidos" e
viajar juntos. A primeira parada
seria na Costa do Sauípe (Bahia).
Jair, porém, não pensou em sonho algum ao ouvir a pergunta de
Silvio. Só pensou que se tratava de
uma questão estranhamente fácil.
Facílima. "Dezesseis letras", respondeu após os 20 segundos.
Errou. "Ordem e Progresso", o
lema da bandeira nacional, soma
15 letras. O professor -que atravessara as últimas três décadas e
meia lecionando português em
pequenas cidades do interior de
São Paulo e Minas- morrera na
praia, traído pela matemática.
Despediu-se de Silvio Santos
com apenas R$ 300 no bolso. O
cachê, que todos os participantes
do programa recebem, não daria
conta de saldar nem mesmo o aluguel do próximo mês. Para morar
sozinho numa casa de três dormitórios em Guaxupé (MG), Jair paga R$ 340.
A ascensão e a queda do professor aconteceram em dezembro.
No dia 20, ele abocanhou os R$
500 mil. Um dia depois, errou a
pergunta final. Na noite que separou a vitória da derrota, dormiu
em um bom hotel paulistano e
jantou num restaurante chinês,
sempre à custa do SBT. Zezé, que
vive em Itápolis (SP), o acompanhava. Didi, também de Itápolis,
torcia à distância.
Na quinta-feira passada, a emissora exibiu as etapas em que Jair
brilhou. Hoje, às 22h30, deverá
mostrar a derrocada (mais uma
vez, atenção: Silvio Santos adora
mudanças de plano).
"Por que errei? Sei lá... Acidente
de percurso", conjectura o professor, que toca violão e bandolim, lê
"uns cinco livros" mensalmente e
fala quatro línguas com fluência.
"Imaginei que viria uma pergunta
cabeluda e, de repente, aquilo...
Fiquei desnorteado, surpreso. E
acabei trocando as bolas. No lugar
de "Ordem e Progresso", contei as
letras de "Ordem ou Progresso"."
Espírita, o professor sustenta
que não está "triste nem desapontado". "As folhas não caem de
uma árvore se Deus não quiser.
Ele julgou que não deveríamos
vencer. Eu aceito. Talvez o dinheiro nos trouxesse problemas. Além
do quê, não perdi nada. Só deixei
de ganhar."
As duas amigas concordam.
"Deus sabe o caminho da gente",
ensina Didi. "Jair demonstrou coragem quando tentou responder
a pergunta derradeira. Continuo
admirando-o", completa Zezé.
Ela, aliás, escutou de Silvio uma
"palavra de consolo" assim que
tudo terminou. "Aquele homem
se aproximou de mim e disse: "Poxa, Zezé, bem me avisaram que
professor não dá sorte..."."
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Contardo Calligaris: Vida e morte de um ideal: Jack Henry Abbott Índice
|