São Paulo, sexta, 28 de março de 1997.

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CINEMA
Empresa viabilizou realização de `O Paciente Inglês'
Miramax lidera guinada de poder

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
de Washington

Às 23h da noite do Oscar, na última segunda-feira, a polícia de Los Angeles começou a impedir que mais convidados para a festa de comemoração da distribuidora Miramax entrassem no hotel Mondrian, onde ela estava se realizando, porque os bombeiros temiam uma tragédia, devido à a superlotação da sala.
Pessoas com convites e até alguém não identificado que brandia um Oscar de verdade de dentro de uma enorme limusine preta foram mandados de volta para casa pelos policiais.
Essa foi uma das demonstrações mais eloquentes na noite da guinada no poder por que passa a indústria cinematográfica norte-americana.
Dentro do Mondrian, acotovelavam-se nomes como Juliette Binoche, Geoffrey Rush, Glenn Close, Quentin Tarantino, Kenneth Branagh, Michael Eisner (o chefão da Disney), Mick Jagger, Keith Richards e centenas de outros astros e estrelas.
Mais importante: a Miramax teve 20 indicações para o Oscar e o filme que ela viabilizara depois de os grandes estúdios o terem recusado -"O Paciente Inglês"- faturou nove prêmios, mais do que qualquer outro na história, com exceção de "Ben-Hur" e "Amor, Sublime Amor", ambos mais de 25 anos atrás.
Bairro operário
A Miramax é o produto de dois irmãos criados no bairro operário de Flushing, no Queens, subúrbio de Nova York, filhos de uma típica dona de casa judia (Miriam Weisntein) e um cortador de diamantes (Max). O nome da companhia que eles criaram em 1979 é uma homenagem aos pais.
Harvey, 44, e Bob, 42, desenvolveram sua preferência pelo chamado "cinema de arte" por mero acaso, bom gosto inato e incentivo do pai. Adolescentes, foram assistir a "Os Incompreendidos" (1959), de François Truffaut, achando que se tratava de um filme erótico. Não era.
Mas eles gostaram e passaram a frequentar diariamente o cine Mayfair -o único de Queens a mostrar filmes de qualidade- e a discuti-los com o pai.
Mais tarde, os dois largaram a faculdade para dirigir um teatro decadente em Buffalo, no interior de Nova York.
Ali, alternavam shows de rock com uma programação eclética de cinema, que ia dos irmãos Marx a "2001, uma Odisséia no Espaço", de Stanley Kubrick, que, aliás, é o grande ídolo da dupla: eles dizem ter assistido a "Spartacus" (1960) pelo menos cem vezes.
Fundação
Em 1979, eles fundaram a Miramax e começaram a distribuir filmes europeus nos EUA e a apostar em produções independentes nacionais.
Dez anos depois, com um trio de sucessos ("Cinema Paradiso", de Giuseppe Tornatore, "Meu Pé Esquerdo", de Jim Sheridan, e "sexo, mentiras e videoteipe", de Steven Soderbergh), saíram do anonimato.
Os êxitos se avolumaram: "O Piano", "O Carteiro e o Poeta", "Pulp Fiction". Em 93, foi comprada pela Disney por US$ 75 milhões, mas mantém a autonomia (no mesmo ano, distribuiu dois dos mais controvertidos filmes do ano: "Kids" e "O Padre").
Em 96, a Miramax faturou US$ 250 milhões, e seu valor de mercado é estimado em cerca de US$ 1 bilhão.
Embora ela continue pequena diante da grandeza do mercado (a Disney faturou US$ 17 bilhões no ano passado), a Miramax não pode mais ser considerada uma "nanica".
Seu faturamento é igual ao de todas as outras distribuidoras independentes juntas e, com "O Paciente Inglês", em que arcou com 80% dos custos de produção (no total, US$ 34 milhões), ela entra para o seleto grupo de produtores de um Oscar de melhor filme. Nada mau para dois irmãos de Queens.

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