São Paulo, sábado, 28 de março de 2009

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LIVROS

Crítica/"Stockhausen - Sobre a Música"

Palestras de Stockhausen sintetizam a sua radicalidade

Em livro mais indicado para músicos, compositor faz uma defesa da intuição

IRINEU FRANCO PERPETUO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Radicalidade, vanguarda, provocação: esses itens, em alta nos anos 60, ajudam a explicar o sucesso do compositor alemão Karlheinz Stockhausen (1928-2007), cuja reputação transcendeu o círculo restrito da criação erudita contemporânea.
Embora sua obra jamais fizesse concessões ao popular e acessível, Stockausen foi parar na capa de "Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band", dos Beatles, e figuras como Miles Davis, Frank Zappa e Björk se disseram influenciadas por ele. Agora, um livro da Madras oferece a chance de o leitor brasileiro conhecer melhor esse símbolo musical do século 20.
"Stockhausen - Sobre a Música" traz uma série de palestras feitas pelo compositor em Londres, em 1971, e uma entrevista dada a Robin Maconie dez anos mais tarde. O volume é enriquecido com prefácio de Flo Menezes, resumo biográfico, catálogo de obras e minuciosa discografia, que fazem dele preciosa obra de referência.

Serialismo integral
À época das palestras e entrevistas, o compositor não havia dado sua mais polêmica e infeliz declaração, comparando os ataques do 11 de Setembro a uma obra de arte. Tampouco havia finalizado "Licht", ambicioso ciclo de sete óperas escrito de 1977 a 2003 e previsto para durar 29 horas; ou o "Helikopter-Streichquartett" (quarteto de cordas helicóptero), que prevê os integrantes de um quarteto de cordas voando em quatro helicópteros distintos.
Mas já era, ao lado do francês Pierre Boulez, o papa das vanguardas do Pós-Guerra, pregando o serialismo integral. Não são raras, em suas palestras, alusões multidisciplinares, à física de Einstein, à arquitetura de Le Corbusier e ao cinema de Antonioni (cujos processos de expansão e contração em "Blow Up - Depois Daquele Beijo" Stockhausen associa aos de sua própria música).
Contudo, é um livro de músico dirigido a músicos. O leigo poderá se divertir com os relatos da polêmica de Stockhausen com Adorno ou ficar tocado com a infância pobre do compositor (a mãe, depressiva, foi internada em instituição mental e executada pelos nazistas). Mas certamente boiará nas passagens do texto em que ele descreve seu processo de composição em obras-chave como "Aus Den Sieben Tagen" e "Gruppen".
Quem se habituou a acusar de cerebralista o vanguardismo de Stockhausen certamente se surpreenderá com a defesa que ele faz da criação intuitiva -evocando o exemplo de Bach, Beethoven, Brahms e Stravinski, defende a "supremacia da intuição", chamando o compositor de "porta-voz do divino". Sobre a educação musical, ele também passa longe da sisudez.
Defende para o músico um treinamento constante nas artes de gravação e também na dança, visto aqui não como o balé, mas "dança social de verdade, uma vez por semana, como parte do curso de música, por toda a duração do estudo". Para Stockhausen, o musicista tem de ter jogo de cintura, um conselho que até hoje vale repetir.


STOCKHAUSEN - SOBRE A MÚSICA
Autor: Robin Maconie
Tradução: Saulo Alencastre
Editora: Madras
Quanto: R$ 34,90 (238 págs.)
Avaliação: bom



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