São Paulo, sábado, 28 de março de 2009

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Crítica/"Corumbiara"

Inspirado em Coutinho, documentário registra questão social indígena

Destaque de hoje do É Tudo Verdade, filme reabre discussão pendente desde as origens do país: o extermínio dos índios

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Cabra marcado para desaparecer. É sob inspiração da matriz do documentário erigida por Eduardo Coutinho já há mais de duas décadas no clássico "Cabra Marcado para Morrer" que continuamos a encontrar o que de melhor se realiza no campo do registro das questões sociais do Brasil, como em "Corumbiara", de Vincent Carelli.
O filme retoma uma questão pendente desde as origens do país: o extermínio indígena pelo ocupante branco, que se defende ainda com o argumento do "progresso econômico". O que "Corumbiara" mostra é que nas fronteiras da exploração do território se pratica a mesma lei da selva implantada pelos colonizadores portugueses há cinco séculos.
Respeito aos índios, como evoca com toda a cara-de-pau um advogado defensor de latifundiários, é sinônimo de atraso. E o doutor Flausino não se esquece de ilustrar com o exemplo dos EUA e concluir que "foi só depois que acabaram de vez com seus nativos que os EUA puderam crescer e virar grande potência".
Não há, contudo, ingenuidade ou denuncismo no projeto de Carelli e sua equipe. Trata-se mais de expor o funcionamento da lógica do extermínio, constante e contínua, e para isso se faz a opção por um vaivém cronológico entre aquilo que foi e o que ainda resta, condenado a desaparecer logo. Carelli parte, como Coutinho, de um material histórico registrado em 1985, durante a busca de pistas de um suposto massacre em uma aldeia nos rincões de Rondônia.
Orientado pelo indigenista Marcelo Santos, o diretor filmou algumas pistas esparsas da dizimação encontradas num terreno recém-ocupado. Sua intenção àquela altura era realizar um documentário sobre o suposto crime.
Daí em diante o acompanharemos, como um arqueólogo, na busca de algum sobrevivente que possa comprovar aquele crime e punir os culpados ou ao menos impedir que se prossiga o processo de ocupação seguindo regras brutais. A cada traço da presença indígena que ressurge em meio ao que ainda resta de mata, aparecem outras tantas forças na direção contrária, forçando seu apagamento.
Em torno dele, fazendeiros, madeireiros, posseiros e grileiros reagem com um sonoro não à indagação sobre a presença indígena nos locais ocupados. E passo a passo o documentário se alça da simples denúncia de um caso que poderia ser isolado para uma visão mais completa da dinâmica social e econômica na qual o índio se encontra acuado.


CORUMBIARA
Direção: Vincent Carelli
Quando: hoje, às 21h, no Cinesesc; amanhã, às 15h, no Cinesesc; ter., às 13h, no CCBB
Avaliação: bom


NO BLOG - Leia crítica de "Sobreviventes", de Miriam Chnaiderman folha.com.br/ilustradanocinema


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