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Vencedor se baseia em experiência pessoal, diz diretor
Filme romeno de baixo orçamento bate grandes nomes
do cinema como os irmãos Coen, Kusturica e Tarantino
País, que também venceu a mostra Um Certo Olhar,
com "California Dreamin'", ressurge com índices modestos na sétima arte
DA ENVIADA A CANNES
A trama do filme vencedor da
Palma de Ouro, "4 Luni, 3 Saptamini si 2 Zile" (4 meses, 3 semanas e 2 dias), é baseada "numa experiência pessoal", segundo afirmou em Cannes seu
diretor, Cristian Mungiu.
A história se passa nos anos
80, quando, na Romênia sob a
ditadura de Nicolau Ceaucescu,
o aborto estava proibido.
A jovem universitária Gabita
(Laura Vasiliu) decide interromper uma gravidez. A gestação avança até o tempo referido
no título do filme.
Para contornar as dificuldades impostas pela clandestinidade do ato, Gabita recorre à
amiga Otilia (Anamaria Marinca), uma das cinco estudantes
com quem divide o quarto na
moradia estudantil.
Embora a gravidez seja de
Gabita, é Otilia quem protagoniza o filme. O espectador
acompanha seus passos, um a
um, no dia marcado para a operação clandestina.
Ela se desincumbe de tarefas
como conseguir dinheiro emprestado, alugar o quarto de hotel onde Gabita fará o aborto e
levar até lá o "profissional"
contratado para a tarefa.
A data da intervenção coincide com o aniversário da mãe de
seu namorado, que, sem saber
do compromisso de Otilia com
a amiga, escolhe essa ocasião
para apresentá-la à família.
O atraso de Otilia para a festa
e um embaraço provocado por
outro convidado à mesa elevam
a tensão entre o casal.
Mas o ponto máximo da tensão em "4 Luni, 3 Saptamini si 2
Zile" é trazido pelo personagem do médico, que, ao descobrir que a gravidez de Gabita
está mais adiantada do que ela
havia dito, impõe uma exigência adicional (e sórdida) como
pagamento ao seu trabalho.
Além da carreira de Mungiu,
a Palma de Ouro que o diretor
recebeu ontem destaca a cinematografia de um país que, no
início da década, havia deixado
de existir para o cinema.
Em 2000, a Romênia não
produziu nem sequer um longa-metragem. O renascimento
-promovido à base da fusão
entre investimentos privados,
apoio financeiro estatal e co-produções com outros países-
conduziu à cifra de dez filmes
concluídos no ano passado.
Os demais índices do cinema
romeno também são incipientes -total de 110 cinemas em
operação e 2,8 milhões de ingressos vendidos em 2006.
O Brasil, que tem população
muito mais numerosa, mas está
longe de ser uma potência cinematográfica, possui 2.045 salas,
produz aproximadamente cem
filmes por ano e vende cerca de
90 milhões de ingressos.
Ressurgimento
O festival já havia direcionado sua atenção para o ressurgimento do cinema romeno, premiando "A Morte de Dante Lazarescu", de Cristi Puiu, na
mostra Um Certo Olhar de
2005 e dando a Caméra D'Or
(dedicada ao melhor filme de
estreante em longas) no ano
passado para "A Leste de Bucareste", de Corneliu Proumboiu.
Além da Palma de Ouro e do
prêmio da crítica a "4 Luni, 3
Saptamini si 2 Zile", a Romênia
venceu a mostra Um Certo
Olhar, com "California Dreamin'", de Cristian Nemescu.
O filme é ambientado em
1999, quando, enviado pela
Otan, um pelotão norte-americano transporta um carregamento de armas em direção a
Kosovo, mas fica retido numa
cidade do interior da Romênia,
por uma autoridade local.
É o primeiro longa de Nemescu e foi exibido em Cannes
como uma obra inconcluída. O
cineasta trabalhava na montagem do filme quando sofreu um
acidente de carro fatal no ano
passado. Ele tinha 26 anos.
Pamuk
Membro do júri presidido
pelo diretor Stephen Frears,
que definiu os vencedores da
competição oficial, o escritor
turco Orhan Pamuk, Nobel de
Literatura, definiu "4 Luni, 3
Saptamini si 2 Zile" como "um
filme econômico e extremamente bem feito, que se tem
prazer de ver cada seqüência".
Pamuk disse que havia "outros ótimos filmes" na disputa,
mas que o júri não teve dificuldades de chegar ao veredito.
"Aqui em Cannes, celebramos
o cinema como arte", afirmou.
A cerimônia de premiação foi
sucinta e conduzida num tom
de austeridade pela atriz alemã
Diane Krueger.
Frears ateve-se a dizer apenas o nome do vencedor de cada categoria, sem comentários
ou justificativas às escolhas. A
exceção foi para o prêmio principal. "Tenho a honra de anunciar que o vencedor da Palma é
"4 Luni, 3 Saptamini si 2 Zile"."
Dois convidados a entregar
prêmios quebraram o protocolo. O ator Alain Delon, que se
reconciliou neste ano com o
Festival de Cannes, disse: "Entre meus defeitos, tenho o que
vocês sabem de não fazer nada
igual a todo mundo".
Em seguida, Delon pediu 25
segundos de aplausos para a
atriz Romy Schneider (1938-82), com quem trabalhou e teve
um romance. E foi atendido.
O ator francês de origem argelina Jamel Debbouze fez um
irônico discurso contrário ao
presidente Nicolas Sarkozy,
que terminou com um "Viva a
República! Viva a França!".
Premiado pelo roteiro de
"Auf Der Anderen Seite" (do
outro lado), que também dirige,
o alemão de origem turca Fatih
Akin terminou seu agradecimento com uma "mensagem
especial para a Turquia". Disse:
"Precisamos ficar unidos ou
tombaremos".
"Auf Der Anderen Seite" é
uma sequência de "Contra a
Parede", longa de ficção anterior de Akin, vencedor do Urso
de Ouro no Festival de Berlim.
O novo filme acompanha seis
personagens lidando com o
amor e a morte, em suas relações amorosas e de pais e filhos,
entre a Turquia e a Alemanha.
A iraniana radicada na França Marjane Satrapi, cujo exílio
pós-revolução islâmica é contado no longa de animação
"Persepolis", dedicou o Premio
do Júri que recebeu "a todos os
iranianos, embora essa seja
uma história universal".
O mexicano Carlos Reygadas, que dividiu com "Persepolis" o prêmio do júri por "Stellet
Licht" (luz silenciosa), em que
aborda uma comunidade religiosa ortodoxa (menonita) vivendo no México, resumiu seu
discurso a um "obrigado".
(SILVANA ARANTES)
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