São Paulo, segunda-feira, 28 de junho de 2010

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Totem "fascista" volta à Guarapiranga

Monumento em homenagem a aviadores italianos dos anos 1920 tem dois "fasci" e coluna doada por Mussolini

Obra de nove metros de altura passou 25 anos nos Jardins e agora retorna à represa, local para onde foi projetada

IVAN FINOTTI
DE SÃO PAULO

Após 25 anos no exílio, chega hoje ao fim uma injustiça histórica com o monumento Heróis da Travessia do Atlântico, escultura de bronze com um homem alado sobre um pedestal de granito.
Desmontada em cerca de 40 pedaços na quarta-feira da semana passada, a obra tinha viagem marcada para ontem a bordo de uma carreta com destino à beira da represa Guarapiranga, onde será restaurada.
Em meados dos anos 1980 o prefeito Jânio Quadros decretou que a escultura, inaugurada em 1929 ao lado da represa, estava escondida nos confins da zona sul e determinou sua transferência para um canteiro nos Jardins, em frente à igreja Nossa Senhora do Brasil, na esquina da avenida Brasil com a rua Colômbia.
Uma injustiça com a obra e com a represa Guarapiranga, já que o monumento havia sido projetado para comemorar o feito de aviadores que haviam amerissado com seus hidroaviões ali mesmo, após viajar por todo o oceano a partir da Itália.
O Heróis da Travessia ao Atlântico sempre foi polêmico. O general Francesco de Pinedo, por exemplo, fez a travessia instruído por Benito Mussolini, interessado em propagar os feitos de sua nação. Empolgada, a grande comunidade italiana em São Paulo chegou a sugerir uma escultura para o político.
A homenagem veio na forma de Ícaro, ao qual Mussolini adicionou um presente: uma coluna em granito rosa retirada de uma antiga construção em Roma.
A obra foi executada pelo escultor, pintor, desenhista e ceramista Ottone Zorlini (Treviso, 1891 - São Paulo, 1967) e traz um "fascio" de cada lado. "Fascio" ("fasci", no plural) é um feixe de varas utilizado por militares para representar a união e foi resgatado por Mussolini para simbolizar sua ideologia.

PICHAÇÃO
Por tudo isso, o monumento foi alvo de pichações e tachado de fascista. "O que não é verdade", discorda a arquiteta Fabiula Domingues, autora do projeto de restauração da escultura. "Não tem ligação com a ideologia, e sim com um momento histórico."
André Aaltonen, arquiteto responsável pelo desmonte e transporte dos 40 pedaços dos Jardins para a represa, bem como pela remontagem no local de origem, lembra que a homenagem é para os aviadores. "Não é uma obra para Mussolini, e sim para festejar o feito dos aventureiros daquela época."
Desde os anos 1990, moradores da região pedem pela volta do monumento. "Se não fosse pelos abaixo-assinados, a obra jamais retornaria", diz Fabiula.
Agora, além de voltar para perto da água, a escultura ganhará o acompanhamento de uma miniatura feita com o mesmo material original e explicações em braile, para que deficientes visuais tenham acesso a essa história. O custo de toda a operação, com término previsto para agosto, ficou em R$ 390 mil.


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