|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Totem "fascista" volta à Guarapiranga
Monumento em homenagem a aviadores italianos dos anos 1920 tem dois "fasci" e coluna doada por Mussolini
Obra de nove metros de altura passou 25 anos nos Jardins e agora retorna à represa, local para onde foi projetada
IVAN FINOTTI
DE SÃO PAULO
Após 25 anos no exílio,
chega hoje ao fim uma injustiça histórica com o monumento Heróis da Travessia do
Atlântico, escultura de bronze com um homem alado sobre um pedestal de granito.
Desmontada em cerca de
40 pedaços na quarta-feira
da semana passada, a obra tinha viagem marcada para
ontem a bordo de uma carreta com destino à beira da represa Guarapiranga, onde
será restaurada.
Em meados dos anos 1980
o prefeito Jânio Quadros decretou que a escultura, inaugurada em 1929 ao lado da represa, estava escondida nos
confins da zona sul e determinou sua transferência para um canteiro nos Jardins,
em frente à igreja Nossa Senhora do Brasil, na esquina
da avenida Brasil com a rua
Colômbia.
Uma injustiça com a obra e
com a represa Guarapiranga,
já que o monumento havia sido projetado para comemorar o feito de aviadores que
haviam amerissado com seus
hidroaviões ali mesmo, após
viajar por todo o oceano a
partir da Itália.
O Heróis da Travessia ao
Atlântico sempre foi polêmico. O general Francesco de
Pinedo, por exemplo, fez a
travessia instruído por Benito Mussolini, interessado em
propagar os feitos de sua nação. Empolgada, a grande
comunidade italiana em São
Paulo chegou a sugerir uma
escultura para o político.
A homenagem veio na forma de Ícaro, ao qual Mussolini adicionou um presente:
uma coluna em granito rosa
retirada de uma antiga construção em Roma.
A obra foi executada pelo
escultor, pintor, desenhista e
ceramista Ottone Zorlini
(Treviso, 1891 - São Paulo,
1967) e traz um "fascio" de
cada lado. "Fascio" ("fasci",
no plural) é um feixe de varas
utilizado por militares para
representar a união e foi resgatado por Mussolini para
simbolizar sua ideologia.
PICHAÇÃO
Por tudo isso, o monumento foi alvo de pichações e tachado de fascista. "O que não
é verdade", discorda a arquiteta Fabiula Domingues, autora do projeto de restauração da escultura. "Não tem ligação com a ideologia, e sim
com um momento histórico."
André Aaltonen, arquiteto
responsável pelo desmonte e
transporte dos 40 pedaços
dos Jardins para a represa,
bem como pela remontagem
no local de origem, lembra
que a homenagem é para os
aviadores. "Não é uma obra
para Mussolini, e sim para
festejar o feito dos aventureiros daquela época."
Desde os anos 1990, moradores da região pedem pela
volta do monumento. "Se
não fosse pelos abaixo-assinados, a obra jamais retornaria", diz Fabiula.
Agora, além de voltar para
perto da água, a escultura ganhará o acompanhamento
de uma miniatura feita com o
mesmo material original e
explicações em braile, para
que deficientes visuais tenham acesso a essa história.
O custo de toda a operação,
com término previsto para
agosto, ficou em R$ 390 mil.
Texto Anterior: "Ele era um individualista radical, mas não era inocente" Próximo Texto: FOLHA.com Índice
|