São Paulo, sexta-feira, 28 de julho de 2000


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ANIMA MUNDI
Cineasta vencedor do Oscar tem bate-papo com o público
"Herói" russo pinta com dedos e fala hoje em SP

Vânia Delpolo/Folha Imagem
O cineasta russo Aleksandr Petrov, que ganhou o Oscar de animação e está no Brasil para participar do Anima Mundi 2000


IRINEU FRANCO PERPETUO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Um grande orgulho nacional russo fala hoje com o público brasileiro. Vencedor do Oscar 2000 na categoria curta de animação com "O Velho e o Mar", baseado no conto de Hemingway, Aleksandr Petrov tem bate-papo com a platéia hoje na programação do 8º Festival Internacional de Animação do Brasil, o Anima Mundi 2000 (veja quadro ao lado).
O filme é uma co-produção com canadenses e japoneses.
Residente em Iaroslavl (250 km a nordeste de Moscou), Petrov tem a literatura como fonte constante de inspiração -antes de Hemingway, levou às telas contos de Andrei Platonov e Fiódor Dostoiévski.
Com formação de artista plástico, destaca-se por uma meticulosa técnica, na qual cada fonograma é uma pintura feita com dedos e pincéis sobre placa de vidro.
Leia abaixo trechos da entrevista exclusiva que deu à Folha.

Folha - Os temas de seus filmes costumam vir da literatura. Por quê?
Alexandr Petrov -
É difícil dizer. Eu prefiro confiar o roteiro a um tema já escrito -como um conto. Talvez seja por isso que eu escolha a literatura, pois posso ver, no papel, a história que desejo levar ao cinema.

Folha - Você escreve os roteiros de seus filmes?
Petrov -
Normalmente não, o que faço é desenhar o "story board". Para mim, isso é mais simples, já que eu sou um pintor.

Folha - De onde veio a idéia de "O Velho e o Mar"? Depois de trabalhar com textos de autores russos, por que escolheu um americano?
Petrov -
Foi minha idéia. Não escolhi os temas por serem russos ou americanos; gosto deste conto e resolvi trabalhar com ele. Eu queria fazer essa história há muito tempo. Cheguei a encomendar o roteiro do filme, mas não o recebi. Coincidentemente, o que aconteceu foi que uma conhecida minha escreveu o roteiro e o levou ao Canadá -o que não foi idéia minha, mas acabou vindo ao encontro de minha iniciativa e meu desejo de fazer o filme.

Folha - Hemingway é conhecido na Rússia?
Petrov -
Naturalmente. Ele foi muito popular nos anos 60. Era possível ver, por toda parte, penduradas pela juventude, retratos dele, principalmente nas casas. Nas escolas não, mas nos lares esse escritor era muito amado.

Folha - Foi uma surpresa ganhar o Oscar?
Petrov -
Foi a terceira indicação, de modo que não foi uma surpresa. Eu naturalmente esperava este prêmio, fui a Los Angeles nas três vezes e não queria sair novamente sem o prêmio.

Folha - O Oscar é importante na Rússia?
Petrov -
Sim, eu virei uma espécie de herói depois de receber o prêmio. O país inteiro ficou sabendo. Nos jornais e na televisão, se falou muito do "Oscar russo". Lá todos acham que esse filme é mais russo do que canadense ou japonês, já que o diretor é russo e o prêmio foi para a Rússia. Foi uma vitória russa.

Folha - Onde você fez o filme?
Petrov -
No Canadá. Eu não escolhi o país, fiz o filme a convite de meus amigos. Foi meu primeiro trabalho com países estrangeiros.

Folha - Você não teria melhores condições de trabalho se emigrasse para os Estados Unidos ou para o Reino Unido?
Petrov -
Nunca pensei em emigrar. Amo minha pátria, nasci lá e desejo lá morrer.

Folha - Há dinheiro para o cinema e para as artes em geral na Rússia?
Petrov -
Muito pouco. Pouquíssimas pessoas podem fazer filmes com roteiro próprio, idéia própria, enfim, filme de autor. Fazem-se mais filmes sob encomenda. A situação não é simples, mas se trabalha. Se há possibilidades, se há vontade, talvez o dinheiro não seja o mais importante para conseguir fazer um filme.

Folha - Como é a distribuição de filmes na Rússia? Os americanos dominaram tudo?
Petrov -
O problema é grande. O mercado cinematográfico diminuiu, os filmes russos cessaram de ser feitos, e os filmes americanos tomaram os cinemas e televisões. Mas o público russo gosta de filmes russos.

Folha - O que lhe interessa no cinema ocidental?
Petrov -
Nada em particular. Gosto de trabalhos que tragam novidades, que mostrem novas visões, novas formas.

Folha - Por que o sr. escolheu a técnica de pintura de dedos e pincéis sobre uma placa de vidro?
Petrov -
Antes de tudo, sou um pintor. Trabalhei muito como pintor para outros diretores. Para mim, é a chance de fazer duas coisas que amo: filmar e pintar.

Folha - Você fez seu último filme para ser exibido em IMAX, mas aqui não temos esse projetor. O público brasileiro vai sair prejudicado?
Petrov -
A idéia de fazer o filme para projetor IMAX foi dos produtores japoneses e canadenses. Eu era contra, mas, depois dos primeiros testes, achei interessante e parei de ter medo da tela grande. Mas a cópia em 35 milímetros a ser exibida aqui é boa, e o filme continua o mesmo.

Folha - O que você espera da conversa com o público brasileiro?
Petrov -
Não sei. Não estou habituado a esse tipo de conversa. Enfim, como se trata de outro país, é sempre interessante.

Folha - Você conhece algo do cinema brasileiro?
Petrov -
Infelizmente não. Espero entrar em contato com a animação brasileira. Sei que há coisas novas e interessantes.

Folha - Quem o influenciou mais: pintores ou diretores?
Petrov -
Pintores, diretores, operadores, fotógrafos, escritores... Muita gente. Como pintor, sinto-me muito influenciado por Rembrandt e pelos franceses. No cinema, amo Tarkosvki, cinema francês, Bresson, neo-realismo italiano...

Folha - Por que Rembrandt?
Petrov -
É difícil dizer em poucas palavras... Gosto de sua humanidade, de seu sentido extraordinário da alma humana e de sua capacidade de retratar a tragédia e a alegria humana. Nesse sentido, é um artista único, e tentei aprender alguma coisa com ele.


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