São Paulo, sábado, 28 de julho de 2001

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HISTÓRIA/ESTADOS UNIDOS

ESCRAVIDÃO

Estudo clássico do historiador David Brion Davis chega ao Brasil 35 anos depois de ser escrito

Debate abolicionista ilumina drama racial da atualidade

SYLVIA COLOMBO
EDITORA-ADJUNTA DA ILUSTRADA

O preconceito racial nos EUA não tem origem apenas no período colonial, mas possui suas raízes em interpretações do legado da Antiguidade clássica à Europa do período dos Descobrimentos.
Para o historiador americano David Brion Davis, 74, autor do clássico "O Problema da Escravidão na Cultura Ocidental" (1966), a recuperação do debate entre abolicionistas e defensores da escravidão no século 18 permite compreender o racismo que persiste na sociedade dos EUA.
Estudioso da escravidão, da história da imagem do negro e da questão racial, Brion Davis tem seu livro mais famoso lançado pela primeira vez no Brasil agora, 35 anos depois da edição em inglês.
O livro ganhou o Prêmio Pulitzer em 1967 e tem como tema principal o contexto que tornou propício o debate abolicionista na França, Inglaterra e nos EUA.
Atualmente lecionando na Universidade de Yale, Brion Davis também está finalizando um livro sobre a persistência de valores religiosos na história do país.
Leia abaixo a entrevista que o pesquisador deu à Folha, por telefone, de Nova York.

Folha - O que o atraiu primeiro para o tema da escravidão?
David Brion Davis -
O fato de ela ter durado tanto tempo nas Américas enquanto o sentimento abolicionista foi muito pontual e específico de um período. A razão pela qual demorou tanto para que a submissão dos negros causasse revolta é uma demonstração de que ela tinha respaldo cultural, religioso e filosófico. Quis saber porque praticamente não houve condenação moral à escravidão até o século 17 e quase nenhum passo pela abolição até o 18.

Folha - O fato de o senhor ter ganho o Pulitzer nos anos 60 se deve a um contexto histórico específico?
Brion Davis -
Sim, era uma época em que os movimentos de direitos humanos jogavam luz à questão racial. O tema da escravidão nos EUA foi um tabu por longo tempo. Havia uma repressão silenciosa, especialmente depois da Primeira Guerra. Depois da Segunda Guerra, se percebeu a importância da escravidão para a construção da economia e da sociedade. Meu livro faz parte dessa recuperação do tema, no fim dos anos 50 e nos 60.

Folha - Como o senhor recebeu a notícia do Pulitzer, em 1967?
Brion Davis -
Eu tinha acabado de chegar à Índia, onde fui dar aulas. Fui interrompido no meio de uma delas por uma repórter da TV indiana. Mas ela dizia que eu havia ganhado o Nobel. Eu pensei: "Não pode ser o Nobel".

Folha - O senhor diz que ainda há lacunas sobre a escravidão. O que falta ser estudado?
Brion Davis -
Uma das chaves para saber como o preconceito subsistiu é estudar melhor a conexão entre escravidão e a estruturação do trabalho depois da abolição.

Folha - Faltam trabalhos como o seu, que é uma análise mais ampla e comparativa da questão?
Brion Davis -
No caso da escravidão e da questão racial, precisamos de mais estudos comparativos e internacionais sobre a história do racismo. Também ajudaria explicar melhor como cada sociedade européia se relacionava com a escravidão. A diferença entre a visão dos povos mediterrâneos e a dos do norte da Europa é muito grande e está na raiz da formação social do Novo Mundo.

Folha - Acha que hoje a compreensão das raízes do preconceito racial é melhor nos EUA?
Brion Davis -
Sou otimista, nós tivemos um declínio significativo do racismo entre os anos 50 e hoje e também do anti-semitismo. Para alguém da minha idade, é assombroso ver como as coisas mudaram nas últimas décadas.


O PROBLEMA DA ESCRAVIDÃO NA CULTURA OCIDENTAL - De: David Brion Davis. Editora: Civilização Brasileira (tel. 0/xx/21/5585-2000). Tradução: Wanda Caldeira Brant. R$ 52 (545 págs.).



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