São Paulo, sexta, 28 de agosto de 1998

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ÓPERA

"La Bohème" no Alfa Real tem muitas deficiências

IRINEU FRANCO PERPÉTUO
especial para a Folha

Em sua primeira incursão operística, o Teatro Alfa Real montou uma "Bohème" para não-iniciados. A música de Puccini é tão bonita que quem não liga muito para a qualidade da interpretação pode até se emocionar.
Já o conhecedor vai encontrar muitas deficiências no elenco "vale quanto pesa". Os cantores foram escolhidos por suas qualidades físicas -e, em alguns casos, a voz parece ser mero detalhe.
A música foi sacrificada em prol da cena -e, tendo em vista os resultados do diretor Jorge Takla, o preço parece alto demais.
Para atrair os jovens, não basta ambientar a ópera nos dias de hoje. Se a direção for quadrada, se os figurinos forem todos pouco atraentes e se a luz não for imaginativa, não adianta nada.
Quando o maior destaque de uma "Bohème" é o pequeno personagem de Colline -em magnífica atuação de Jeller Felipe- há certamente algo de errado.
Uma sensação que se avoluma quando Schaunard (Douglas Hahn) acaba se destacando mais que Marcello (o decepcionante Paulo Szot). Ou quando se vê o papel de Musetta (Gabriela Pace) entregue a uma cantora de bela voz, mas imatura, cheia de deficiências técnicas, que canta tudo tão diferente da escrita de Puccini que nunca se sabe se ela está tomando liberdades excessivas ou simplesmente errando os tempos.
Fernando Portari, tenor de carreira brilhante, teve na quarta uma noite para ser esquecida. Começou a ópera vacilante, fez uma "Che gelida manina" pálida, e jamais chegou a se encontrar.
Seu par romântico, a soprano Rosana Lamosa, esteve bem superior. Para sua caracterização de Mimi, a principal personagem da ópera, ser plenamente satisfatória, faltou um pouco mais de volume.
Mas os problemas dos cantores devem ser relevados quando se pensa na pobre qualidade da jovem Orquestra Experimental de Repertório, especialista em atravessar o ritmo e desafinar. Para agravar, o maestro Jamil Maluf resolveu eliminar os contrastes da partitura de Puccini, regendo tudo de maneira bastante arrastada.
São Paulo ouviu "La Bohème" pela última vez em 89, e sabe-se lá quando vai ter outra chance. Assim, seria mesquinho não recomendar que o público vá assistir esta montagem. É aconselhável, contudo esperar a segunda temporada, no Municipal. Talvez, em novembro, alguns problemas da estréia estejam resolvidos.



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