|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Um abraço do espaço
Divulgação
|
Vista de uma das 35 diferentes Anthropologies instaladas nos EUA |
Arquiteto norte-americano investe em psicologia, artes e sociologia para criar identificação cultural
DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL
Qual é a chave para uma loja
vender bem os seus produtos?
Anunciar? Colocá-los numa ordem tal que a camisa puxe a gravata, que puxe o cinto, que puxe o
sapato, que puxe a meia etc.?
Ron Pompei, 57, arquiteto americano que trabalhou recentemente para redes como Levi's,
Urban Outfitters e a sofisticada loja de móveis e roupas femininas
Anthropologie, acha que não: o
segredo é dar liberdade ao cliente.
Misturando noções de psicologia, antropologia, artes, arquitetura e design, Pompei vem descartando alguns dos preceitos do
marketing atual, que acusa de tratar as pessoas como "burras" e
"homogêneas", em favor de uma
disposição mais "visceral" dos espaços. O cliente precisa sentir empatia pelo lugar, identificar-se.
Uma mulher que entra na Anthropologie do SoHo, em Nova
York, por exemplo, não vai (só)
zapear pelas dezenas de vestidos,
móveis e bugigangas aleatoriamente espalhadas pela loja. Na
concepção de Pompei, ela vai sentir os cheiros, tocar as texturas,
evocar as diferentes histórias presentes em cada um dos objetos
-à venda ou não. Em uma palavra, vai ter uma experiência.
Além de uma convicção pessoal
de Pompei, a proposta vai de encontro ao fenômeno descrito no
livro "The Cultural Creatives", do
sociólogo Paul H. Ray, como a ascensão dos "criativos culturais".
Representando 50 milhões de
pessoas só nos EUA, esse grupo é
formado por pessoas na faixa dos
40 anos cujas preocupações incluem ambientalismo, povos estrangeiros, idealismo, autenticidade. "No geral os criativos culturais são uma terceira força política, e esquerda x direita não serve
para descrevê-los", escreve.
Construídos com elementos de
culturas ancestrais (maias, gregos, aborígenes) ou objetos do século passado, esses espaços construídos por Pompei tentam falar
diretamente ao "senso de aventura e exploração" especialmente
nas mulheres dessa faixa etária.
E como funciona. Nos últimos
cinco anos, as vendas da rede
Anthropologie, criada em 1992 e
com 35 unidades espalhadas pelos EUA, todas desenhadas de
acordo com características específicas da comunidade local onde
estão instaladas, cresceram 40%
ao ano. "É como um oásis numa
área urbana, um lugar onde as
pessoas gostam de entrar e andar.
E quanto mais tempo estiverem
lá, se relacionando com o lugar, é
mais provável que encontrem algo que queiram levar para casa e
tornar parte de sua vida", afirma o
arquiteto, que vem sendo requisitado para criar "transformações"
semelhantes para clientes tão distintos quanto o Discovery Channel, a Academia de Ciências da
Califórnia e a revista "Fortune",
para quem criou a ambientação
do Fortune 500, encontro das
maiores empresas do momento.
Nesta quinta-feira, Pompei participa da conferência "Arquitetura da Globalização", em Campinas, a convite do psicanalista Jorge Forbes. Antes de passar para a
entrevista que ele concedeu à Folha, por telefone, um último dado:
depois de repaginada por sua
agência, a Pompei A.D., o faturamento da cadeia de roupas e acessórios para jovens Urban Outfitters cresceu 313% no primeiro
quarto de 2002, comparado ao
mesmo período no ano anterior.
Sem um centavo gasto com agências de publicidade.
Folha - De onde vem a inspiração
para o trabalho na Anthropologie?
Ron Pompei - Sempre me interessei por sociologia, antropologia, arqueologia. Viajei muito para visitar culturas diferentes, desde os templos no Sri Lanka, Camboja, península do Yukatan, Grécia. O que eu sentia quando ia a
esses lugares é que o que importava era a experiência que eu estava
tendo. De um lugar específico,
que tinha uma história que era
bastante tátil, visceral, imediata.
Não era uma abstração, não era
algo desenhado pelo bem do design. Havia uma história que era
contada à medida que você andava pelo lugar. Então percebi que
deveria fazer espaços que fossem
bastante expressivos, como uma
escultura, mas que também o
abrigassem como uma obra de arquitetura. Arquitetura é algo que
te abraça. É importante como o
espaço pode mudar o seu estado
de espírito, com elementos que
provocam sua imaginação.
Folha - Como vê essa tendência
em oposição ao design de ambientes mais em voga hoje?
Pompei - O que acontece em
muitas lojas é que os corredores
estão colocados em linhas retas,
como uma grade cartesiana. Nunca faço isso. Você não tem que caminhar de modo previsível dentro de um espaço. Pode encontrar
seu próprio caminho. O motivo
de as pessoas gostarem da Anthropologie é porque ativa sua imaginação, e elas começam a conectar os diferentes elementos do
modo que quiserem. Apesar da
variedade de texturas, há uma
harmonia, como uma tapeçaria. E
as pessoas vão conectando pontos
diferentes de seu interesse. Aplicam a imaginação e se tornam autoras de sua própria experiência.
Folha - Experiência é uma das expressões que mais têm sido usadas
no marketing hoje...
Pompei - É a palavra do momento! O que é realmente uma pena,
porque essas palavras perdem seu
significado por isso. O único jeito
de manter o pé no chão é privilegiando não a sua mensagem mas
a experiência do visitante. Em outras palavras: a experiência deles é
primordial, não a sua mensagem.
Se você cria uma experiência autêntica e relevante para alguém,
está servindo a essas pessoas. E isso, no final, é mais poderoso do
que martelar na cabeça dele com
outra mensagem dizendo: "Ei, isso aqui é uma experiência". O
McDonald's está tentando dizer
que a comida deles é boa para você, mas o cara que filmou [o documentário] "Super Size Me" ganhou 12 quilos em um mês!
Quando falam em experiência,
há os que a estão usando apenas
como mais uma palavra do marketing. Você tem de se colocar no
lugar, tem de buscar empatia antes de saber sua motivação. A
maioria do mundo dos negócios
está olhando as coisas analiticamente, levantando números, fazendo planilhas. No lugar de se
perguntar qual é a experiência
real, eles pensam de um ponto de
vista logístico, operacional.
Há lugares que são ótimos para
as mercadorias, mas terríveis para
as pessoas. Não há espaço para
abraçar a humanidade. Mas há espaço para entulhar mais commodities. Você vai a um supermercado nos EUA e encontra 40 marcas
de pasta de dente. Eu não preciso
de 40 marcas. Me faça um favor e
diga quais são as 12 melhores. Daí
eu escolho.
Folha - Que importância há em
conhecer a cultura local para descobrir os desejos do público?
Pompei - Há um conceito de
identidade corporativa muito limitado. Podemos ver 10 mil tonalidades de verde e ainda assim sabemos o que é uma árvore, enquanto as marcas tentam nos dizer que, se não se mantiverem as
mesmas aonde quer que forem,
não serão reconhecidas. Estão dizendo que você é burro, que, se eu
usar um casaco preto num dia e
trocar no outro, você não vai me
reconhecer. Nós gostamos de variedade, de nuances, de sutilezas,
de coisas que fazem a vida interessante. Se você está em Seattle, vai
se vestir de forma bem diferente
de quem está em South Beach, na
Flórida. E os marqueteiros pensam no mercado como algo além
deles próprios. Eles se perguntam
sempre o que o público quer, como se não fossem parte do público. As pessoas sempre me perguntam qual é a próxima tendência. E eu respondo: "Do que você
gosta? Talvez seja essa a nova tendência". Faça algo por você, porque as pessoas que compartilham
os mesmos valores vão aparecer.
Folha - E, na sua opinião, quais
são esses valores?
Pompei - Eu aprecio cultura,
mas outros podem gostar de ciência, história, sei lá. Os tempos mudaram muito desde que os meios
de massa surgiram. Há tantas coisas a se apontar, pessoas querendo mais transparência nas corporações. A Califórnia perdeu 9 bilhões na Enron. Desde o 11 de Setembro o sangue das pessoas vale
mais. Elas não querem algo frio,
abstrato, querem algo mais quente, seguro, pé no chão. Suas famílias valem mais para elas agora.
PALESTRA COM RON POMPEI. Onde:
Espaço Cultural CPFL (r. Figueiredo
Corrêa, 1.632, Campinas, SP). Quando:
quinta, às 19h. Informações pelo
telefone 0/xx/19/3756-8000.
Texto Anterior: Programação Próximo Texto: Frase Índice
|