São Paulo, segunda, 28 de setembro de 1998

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VÍDEO LANÇAMENTOS

Boogie nights

CECÍLIA SAYAD
da Redação

Tome-se aquilo que um filme precisa para agradar gregos e troianos (ou crítica e público). "Boogie Nights - Prazer sem Limites", de Paul Thomas Anderson, tem tudo para satisfazer ambos.
Tanto que ter sido retirado do circuito comercial de São Paulo após apenas uma semana em cartaz causou espanto. Pouco tempo depois, voltou em uma sala e um só horário, estendendo o período de sua exibição. E lotou sessões.
Não era para menos. Anderson conseguiu desenvolver uma história cujo conteúdo tem bastante apelo com uma linguagem que, se não traz grandes novidades, pelo menos demonstra inventividade.
O filme apresenta a trajetória de Dirk Diggler (Mark Wahlberg), um ator de cinema pornô, do final da década de 70 (início e apogeu) até o início dos 80 (decadência).
(Anos 70 para os nostálgicos dos 90. Junte-se a isso os inevitáveis sexo e drogas, nota dez para Anderson em atratividade do tema.)
Ao redor de Diggler, circula uma galeria de personagens não só fascinantes, mas bem desenvolvidos -com um lado trágico e outro cômico, às vezes patético, e cujas trajetórias têm finais surpreendentes.
Os principais: Jack (Burt Reynolds), o diretor que cria o mito Diggler, sua mulher Amber (Julianne Moore), viciada em cocaína, que perde a guarda do filho do primeiro casamento e possui um instinto maternal que a faz "adotar" quem aparecer pelo caminho, "Roller Girl" (Heather Graham), que nunca tira os patins.
A lista completa é extensa. Mas ninguém passa desapercebido por Anderson, que segue o preceito hitchcockiano de nunca desperdiçar um papel, mesmo secundário.
Uma vez que a questão é o fascínio que exercem os personagens, cabe observar que o que é mais cativante em Dirk Diggler é a sua ingenuidade. Ainda que ela esteja diretamente relacionada com seu egocentrismo -todo egoísta tem um quê de ingênuo.
Diggler possui um pênis de tamanho surpreendente, além disso, no início de sua carreira, gentileza e idealismo comoventes.
Claro, todos da equipe de Jack querem o seu bem -ele é adotado como mascote e mesmo um possível rival, Reed, é cativado e constitui com Diggler uma dupla que, na infantilidade de ambos, vai revolucionar o cinema pornô. Até aí, tudo é alegria e a câmera faz maravilhosos "travellings". Os anos, 70.
Aí chegam os 80 e a necessidade de novos astros. Diggler, ameaçado, afunda-se nas drogas. Perde eficiência em seu desempenho sexual, larga a carreira e se prostitui. A câmera fica mais comportada, entra o drama. O ritmo do filme muda -o tom, nem tanto.
Se antes havia o trágico por trás do cômico -vide o pateticismo das conquistas profissionais de Diggler, como a série que protagoniza com Reed- agora a desgraça guarda espaço para o humor -como a absurda missão de engabelar um louco armado e perigoso que mora com um chinês que solta fogos de artifício no meio da sala.
O melhor de "Boogie Nights", porém, não é a fusão dos dois registros, mas a capacidade de extrair poesia do que poderia ser tachado de imoral. O humor de Anderson, que nesse campo poderia cair em preconceito, reforça antes um sentimento de simpatia e respeito. Escapar ao moralismo e ao puritanismo do cinema americano já é uma grande coisa.

Filme: Boogie Nights - Prazer sem Limites
Direção: Paul Thomas Anderson
Produção: EUA, 1997, 156 min
Com: Mark Wahlberg, Burt Reynolds, Julianne Moore, Heather Graham
Lançamento: Warner (tel. 011/820-6777)




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